sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Dakṣiṇāmūrti Stotram, aula 4, resumo - Vaidika

Duração da aula 45m05s; cânticos iniciais.

Dakṣiṇāmūrti Stotram, também chamado de Dakṣiṇāmūrti Aṣṭakam, é um texto que tem o peso de Upaniṣad, ou Brahma Sūtra. Na realidade, antes de Brahma Sūtra, geralmente, cantam-se estes versos pois são considerados muito importantes. Também, em homenagem a Śaṅkara canta-se muito esta obra.

No mundo, estabelecem-se vário tipos de relacionamento, como o relacionamento com o corpo – ele é o efeito de alguma coisa (kāryam), ele tem uma causa (kāraṇa), que vai produzir um corpo, uma situação de família, um tipo de mente (o karma de vidas passadas). A todo o momento, vê-se a relação de “causa-efeito” (kāraṇa, kāryam). Nada é isolado. As minhas escolhas irão criar um corpo futuro, em relação a uma coisa ele é causa, e, noutras efeito. Constantemente, as coisas estão misturadas, causa e efeito, isso refere-se a mithyā, aquilo que é aparente, aquilo que não é absoluto, que não é possível determinar.

Uma outra relação é aquela do aluno e do professor. Ninguém é absoluta e constantemente professor. Na frente do seu próprio professor, é-se sempre aluno. Este conhecimento que me fez “grande” deve-se a um professor. Em relação a alguns é-se professor, e, a outros aluno.

As relações não são absolutas mas relativas e em relação a pontos de referência. A consciência é absoluta, tudo o resto é alguma coisa de um ponto de vista, e, outra coisa de outro ponto de vista.

Também através da relação pai e filho: todo o pai foi filho, em algum momento, e em potência uma pessoa poderá ser pai/mãe. No universo nada é absoluto, as coisas existem em relação a pontos de referência e existem sempre que a mente está presente, (acordado ou sonhando). As coisas são produzidas através de māyā, a ilusão, como todos os objetos de ouro são, fundamentalmente, ouro.

A professora Gloria fala detalhadamente sobre as 8 formas de īśvara.

No último verso, é dado o fruto deste estudo (phalam śruti): o conhecimento. Escutando este stava/stuti, refletindo no significado das palavras, meditando/contemplando e cantando estes versos em formato kīrtana cria-se uma relação, um víncul. A repetição no olhar [a forma], cantar e repensar, cria uma relação - vem a descoberta que sou o todo, sarva, do tamanho do universo, o conhecimento que eu sou esse livre de limitação. Essa pessoa ganha o estatuto de īśvaratvam, ganha-se a identidade com īśvara, eu não sou diferente dele, não sou separado dele. O principal fruto é o entendimento dessa não separação com īśvara, ver a realidade que vai além dos meus olhos, a minha natureza fundamental livre de limitação.

O que quero é descobrir a paz, a plenitude, a satisfação dentro de mim.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Dakṣiṇāmūrti Stotram, aula 3, resumo - Vaidika

Duração da aula 45m15s; cânticos iniciais.

Quando se fala de darśana, uma visão/filosofia/interpretação parcial do Veda, sobre a Realidade Última, tattva, a Verdade do universo e mokṣa, a liberação, darśana confere ou discute as definições do Veda. Quando o Veda fala nos rituais, a pessoa é considerada como pessoa (indivíduo) porque brahma não faz ritual; o Veda também tem a visão de algo a mais do relativo e essa visão do absoluto é a visão típica do Veda. Então, se as darśanas dizem algo sobre a Verdade pode haver refutação porque o Veda fala da visão advaita, a “visão maior” - tattvamasi.

Conta-se a historia de Kumarilabata e Śaṅkara para ilustrar a necessidade de conhecer outros pontos de vista para se poder refutar com conhecimento de causa outras visões, como o budismo, acerca da Realidade Última.

No verso 5, Śaṅkara menciona que:
a) para alguns, “o Eu”, a realidade, é o corpo – portanto “aproveite o corpo ao máximo e tenha tantos prazeres quanto possíveis, sem se importar com dharma, já que, quando acabar o corpo acaba tudo!”. Do género: “faça dívidas, já que, depois de morrer você já não paga!”.
b) para outros, mais que o corpo o prāṇa, o prāṇa é o mais importante – ainda assim é materialista (“cuidar ao máximo da saúde, mas, aproveite e divirta-se”);
c) outros dizem que é os sentidos e a mente, “o Eu é a mente” – então torna-se necessário ter uma boa mente.
d) outros diz também: “não, a realidade é calām buddhi, a consciência que está sempre em movimento, a cada momento uma nova consciência”;
e) outros ainda dizem: “Não é isso! Na hora que se está consigo mesmo, em sono profundo, não existe nada, apenas um vazio total, e esse vazio é você, śūnyam.” Referindo-se ao zen budismo, o sujeito quando se dissolve é esse vazio, sem forma, sem nada.

Para Śaṅkara, todos eles estão enganados quanto à realidade, e “são como mulheres”, latu sensu, já que, independentemente de perceberem as explicações não as seguem pois sentem de outra forma, sem lógica. Ou, são como as crianças, sem maturidade, sem sustentarem os seus argumentos. Ou como os cegos, que se fiam somente na experiência e na lógica e não no śastra. Ou como o idiota, que nem vale a pena escutar ou seguir, ou seja, os śūnya vada – raciocinam e argumentam mas concluem que o Eu é um vazio, “como alguém pode dizer que Eu não existo – o Eu é śūnyam”.

“Saudações a esse mestre que destrói todos os grandes erros criados por essa projeção de māyā”. Ela é maravilhosa porque projecta cada coisa diferente para cada pessoa, e, mesmo olhando a mesma coisa vêem coisas diferentes.

Quando existe eclipse, do sol ou da lua, a terra cobre-os parcialmente. Primeiro, a luz que tudo ilumina é o sol e, segundo, ainda se vê uma luz ao seu redor. Embora estejam ocultados há evidências que estejam ali. Neste verso, diz que eles apesar de ocultados têm uma forma de saber que estão ali , ou seja, da mesma forma no sono profundo há uma maneira de saber que “o Eu” está ali, pois, na hora de acordar a pessoa diz: “dormi, mas dormi bem”. Há ausência do objeto mas há a consciência disso. O sol apesar de eclipsado, ocultado, não está ausente. Da mesma maneira, encoberto por essa māyā, no sono profundo, com os sentidos recolhidos quando acorda diz “eu dormi” - essa afirmação demonstra que havia qualquer coisa ali. A memória, “acordado, dormindo, acordado – eu estava acordado, dormi e acordei” é o maior argumento. Na Gītā, Kṛṣṇa diz que é a memória e o esquecimento. O esquecimento também é ótimo e necessário para podermos crescer, lembranças e esquecimentos são uma grande benção.

Fala-se também de vários estados: a infância, a adolescência, a fase adulta e de idoso. Tudo isso é passado por um sujeito que é o mesmo apesar das fases mudar. O conhecimento muda mas “o Eu” continua. Também existe o acordado, o sonhando o dormindo. As várias condições como corpo físico, subtil, causal, constantemente mudando e mutuamente oposto – infância não é adolescência nem estado adulto. Quando uma acontece a outra não acontece, o acordado não é o dormindo. É único e está em constante transformação. Porém, existe um anuvartamānam, uma continuidade – a experiência do constante mutante é uma experiência, mas, apesar disso, existe alguma coisa que continua “anuvartamānam: aham, aham, aham”. O conceito de Eu é Eu de qualquer maneira, “eu na infancia”, “eu na junventude”, “eu na fase adulta”, acrescentando adjetivos, “gordo”, “pequeno”, etc, mas, “só Eu era presença”. Existe uma presença constante apesar das mudanças. O intelecto estava sempre brilhante da mesma maneira, consciente, sempre brilhando. Esse mestre que desdobra, revela o sujeito, “o Eu”, aos seus discípulos, devotos desse conhecimento, é Dakṣiṇāmūrti (os outros professores só abrem a boca). A esse as minhas reverências.

domingo, 20 de novembro de 2011

Dakṣiṇāmūrti Stotram, aula 2, resumo - Vaidika

Duração da aula: 59m33; cânticos iniciais.

A professora fala sobre o livro de Svāmī Tattvavidānanda, “Dakṣiṇāmūrti Stotram,” elogiando-o e aconselhando a sua leitura a quem procura uma análise mais detalhada do texto.

Nas três primeiras linhas o texto fala alguma coisa diferente sobre esse conhecimento e na última sobre Dakṣiṇāmūrti, o mestre. O mestre Dakṣiṇāmūrti que não tem forma específica, que é todas as formas, que está aqui sobre a forma do meu guru mūrti (o meu mestre) é, na verdade, Dakṣiṇāmūrti falando.

Essa criação é uma multiplicidade formas, sons, texturas, cheiros e sabores, todo o universo é muito variado – todo o universo é nāma/rūpa nome e forma. Nome e forma não têm uma existência independente de consciência. O objeto é, a flor é, o livro é – parece existir uma diferença entre os dois mas não existe diferença em termos da existência. Existe uma variedade de coisas quando se foca em rūpa mas a existência não pertence a flor nem a livro – a existência não tem forma específica e não pertence ao objeto, é comum a todo o universo e na ausência do universo a existência é. A existência é comum ao sujeito e ao objecto, a existência é constante. A não-existência não é um vácuo, um vazio, a não existência é. A existência é a verdade do sujeito que pertence mas ao mesmo tempo não pertence ao sujeito está alem do sujeito. É a base do sujeito, a consciência e a existência é um fator constante, satya, real, a única coisa que é sempre. Todos os nomes e formas vão e vêm constantemente.
A professora dá o exemplo do ouro que assume várias formas e nomes, cordão, pingente, brinco colar para mostrar que todo o ouro na verdade não varia, apenas os nomes e formas comparando com a existência e consciência que é constante e a base. Brinco não existe separado de ouro, ouro existe separado de brinco. As formas são projeções e não têm um conteúdo em si mesmo, não têm uma realidade em si mesmo. O poder de māyā é que faz tudo aparecer, como na experiência da cobra e da corda.

A primeira estrutura deśakāla, tempo/espaço, surge para que seja possível a perceção do próprio universo, a sequência do momento presente dá-nos a sensação do minuto, da hora, do dia – são projeção na nossa cabeça – sessenta momentos presentes e dizemos “passou-se um minuto”, “sete dias, uma semana”, reduzido isso tudo resta uma presença sat/cit. Na verdade, o tempo é uma sequência de sat/cit, pontos de referência projetados pela própria mente.
Esse universo é bīja (semente) que se torna uma árvore continuamente, num ciclo não-manifesto/manifesto. A existência em potencial, manifestação e dissolução por māyā. Em análise, tudo é sat/cit. Todo o universo é visto como externo já que a minha referência é o corpo, mas do ponto do visto da consciência tudo isso é interno - īśvara é chamado de “o grande ilusionista” porque faz aparecer esse universo inteiro do seu próprio saṅkalpa, como um grande yogi que tem o poder de criar, projetar, iludir. O material do universo é do próprio īśvara, não vem de forma.

Em seguida a professora faz uma análise detalhada dos versos seguintes.

Imagem retirada de Original Vedic Art

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Dakṣiṇāmūrti Stotram, aula 1, resumo - Vaidika

Duração da aula: 1h17m21s; cânticos iniciais.

Dakṣiṇāmūrti é uma forma de Śiva que invoca a destruição da ignorância e aquisição de conhecimento. Os devotos de Dakṣiṇāmūrti são pessoas que desejam o conhecimento e a capacitação para esse conhecimento.

No norte [da Índia] não existem muitos templos a Dakṣiṇāmūrti porque não é uma forma muito especifica, já que, o povo vai mais atrás das eliminações dos obstáculos na sua vida e a satisfação dos prazeres (desejos).

Aqueles que vão atrás do conhecimento são os devotos de Dakṣiṇāmūrti. No sul, Svāmīji instituiu os templos a Dakṣiṇāmūrti nos āśrams.

Candramauli, discípulo de Svāmīji, encontrou uma pedra parecida com um Śiva Liṅga na beira do Ganges e procurou levá-la para o āśram, mas não consegui levá-la nem com a ajuda de transeuntes. Falou com o Svāmīji e ele consegui levantá-la à primeira tentativa. Assim, fizeram um templo a Śiva com essa pedra em Rishikesh. No início, o templo era pequeno e com o tempo foi aumentando.

Dakṣiṇāmūrti é um texto a Śaṅkara. Na imagem de Dakṣiṇāmūrti vê-se que ele tem dois brincos, o do lado direito é masculino e o do lado esquerdo é feminino, simbolizando puruṣa e prakṛti, ou seja, o aspeto masculino e feminino imbutidos nele. Tem também um ḍamaru simbolizando o espaço, os vedas na mão, uma bandana no cabelo, gaṅgā na água da cabeça, pṛthivī é a própria estrutura da imagem, o sol e a lua – hastamūrti; os cinco elementos mais o sol e a lua, e, mais a pessoa que olha para a imagem (jīva, o indivíduo). Também se pode dizer que os ṛṣi são os jīva.

No seu pé tem apasmāra, um āsura com cara de adulto e forma de bebé (“the child within”) – ele é a ignorância, a pessoa que não amadureceu – um bébé no corpo de adulto, dependente, com medo. Dakṣiṇāmūrti não está a destruir apasmāra, mas a controlá-lo. A ignorância é māyā e Dakṣiṇāmūrti não está a deixá-la manifestar-se demais.

Nandī está junto a Dakṣiṇāmūrti, representando o discípulo, o dharma e a alegria do conhecimento, através de Nandī se vê Śiva - que não é diferente de mim.

Dakṣiṇā + mūrti – aquele cuja forma está virada para o Sul. Dakṣiṇā quer dizer o lado direito, na Índia a referência é o Este daí que a frente é Leste, as costas Oeste, o lado direito o Sul, então vāma é o esquerdo que é o Norte. Então Dakṣiṇāmūrti está virado para o Sul, o Norte é o conhecimento, o ponto de atração, o Leste também (o nascer do Sol, o conhecimento) mas Dakṣiṇāmūrti sempre olha o Sul, pois ele está além da morte porque ele é além do tempo. Ganesha não pode olhar para o Sul daí que ele esteja a olhar para o leste. Ou Dakṣiṇ e amūrti, ou seja, não tem forma especifica e é dakṣā aquele que possui toda a a capacidade de manter, destruir.

Em seguida, a professora faz a análise verso-a-verso até ao verso 5.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Bhagavad Gita, Aula 19 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 50m03s; cânticos iniciais e invocação à Gītā.

Na primeira parte do capítulo, Arjuna quis saber a diferença entre tyāga (renúncia na ação) e sannyasa (renúncia da ação), e, yoga (moderação). O conhecimento do Eu que nada faz (ātman) é o conhecimento de naiṣkarmya siddhi.

No verso 46, Kṛṣṇa volta à atitude de karma yoga. Para obter o conhecimento do Eu é necessária a exposição ao ensinamento (escutar), refletir e contemplar sobre o que foi escutado e, ao mesmo tempo, trazer īśvara para a vida para tirar a força do ego (ahaṅkāra). Isso acontece ao longo do tempo.

Kṛṣṇa fala a Arjuna para fazer o seu papel, mesmo que pareça destituído de qualidades, e, deixar os outros fazerem os seus papéis.

A partir do verso 50, Kṛṣṇa faz um resumo do ensinamento, nomeadamente, como tranquilizar a mente e conhecer o absoluto (karma yoga e jñānam). No verso 63, Kṛṣṇa diz a Arjuna que o maior segredo de todos é a entrega a um guru que possa ensinar, caso contrário, o conhecimento não surge e mantêm-se confuso, não faz sentido e não é possível usufruir dele. Também é o maior segredo de todos porque esse conhecimento está escondido dentro de cada um, em si-mesmo - que Eu sou o Todo, já completo, ilimitado.

No verso 66 termina todo o ensinamento. Esse verso é cantado quando se finaliza o estudo, que reconhece que eu já sou a Consciência que nada faz, ātman, e que em mim busco refúgio. Esse conhecimento traz a maturidade da mente e conduz conhecimento. Kṛṣṇa fala "não se entregue ao sofrimento", o sofrimento/ilusão elimina-se com a clareza do autoconhecimento.

Nos 12 versos seguintes, Kṛṣṇa refere que esse ensinamento deve ser ensinado àquela pessoa que o deseja: "Onde existir uma pessoa que deseje conhecer este ensinamento (um Arjuna) e uma pessoa que o ensine (Kṛṣṇa), aí estarei Eu". Uma condição deve estar presente também, a pessoa que deseja conhecer deve estar livre de inveja, isto é, com uma mente objetiva. Arjuna diz, finalmente, "a ilusão foi-se!"

A professora Glória, refere que é importante dar a oportunidade a quem escuta pronunciar-se se entendeu ou se ainda tem dúvidas.

Arjuna diz, então, que está livre de dúvida e que agirá de acordo com o ensinamento.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Bhagavad Gita, Aula 18 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h09m58s; cânticos iniciais.

O capítulo XVIII é um resumo de toda a Gītā (a guerra dura 18 dias e a Gītā tem 18 capítulos).

No início, Arjuna pergunta a Kṛṣṇa a diferença entre tyāga e sannyāsa. Kṛṣṇa explica que tyāga está relacionado com karma yoga e sannyāsa com a busca de conhecimento. Neste capítulo, Kṛṣṇa faz um resumo do ensinamento da Gītā e, no final (este capítulo é longo - tem 78 versos), Arjuna entende finalmente a situação.

Kṛṣṇa explica que tyāga é em relação aos frutos da ação. A capacidade de receber o que vem sem reação é chamado de tyāga - atitude de prasāda. Sannyāsa é definido como a renúncia de alguns tipos de ação

A professora Glória fala sobre varnas, āśramas e sobre os diferente tipos de sannyāsa falados no capítulo VI: āpat, vividiṣā e vidvat sannyāsa. A renúncia é uma maturidade, uma apreciação de si mesmo. Kṛṣṇa refere que mesmo abandonando a ação algumas coisas devem ser feitas:
1) yajña - relação com o Todo, quer seja oração ou ritual;
2) dānam - capacidade de doar, o necessário, na hora certa, da maneira certa, nem que seja apenas tempo para escutar alguém;
3) tapas - disciplina, segurar os sentidos que querem "correr" de acordo com os desejos e a mente.

Kṛṣṇa fala sobre a ação do verso 12 ao 45 (quase um capitulo independente). Ele procura tornar claro a renúncia da ação, como já tinha sido falado no capítulo III - estar livre da ação é saber que ātman, o eu, nada faz. Como esta matéria é difícil de entender, Kṛṣṇa volta a falar sobre isso.

Karma está vinculado ao corpo. Fatores necessários para a ação:
1) a base da ação (adhiṣṭhāna): fisica, oral ou mental;
2) vijnanamaya (karta/bhokta/entidade/buddhi/identidade);
3) karaṇa (os instrumentos físicos e a mente);
4) prāṇa;
5) daivam - as forças da natureza: capacidade da mente pensar, do ouvido ouvir.

A ação depende destes fatores anteriores. Além desses fatores, aponta-se ainda o conhecimento dos objectos, o tipo de mente, buddhi e o tipo de força. Assim, karma não pode pertencer a ātman, pois ātman que é livre de guṇas. O ātman não está relacionado com karma, nem com karmaphalam. A ação, enquanto indivíduo vai ser sattva, rajas ou tamas. O eu é somente consciência. Com esse entendimento alcança-se o objetivo maior da vida.

O verso 46 deste capítulo completa o verso 47 do capítulo II: fazendo karma yoga a pessoa capacita-se para alcançar o estado de livre da ação, naiṣkarmya. De seguida, Kṛṣṇa explica que o oferecimento será a execução da ação, fazendo o que deve ser feito - essa pessoa alcança o preenchimento da sua vida, a maturidade emocional, a objetividade. Esta ideia completa a anterior. O yogi é aquele que traz esse conhecimento para a sua vida.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Bhagavad Gita, Aula 17 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h07m11s; cânticos iniciais.

Os últimos capítulos procuram lançar o entendimento da junção entre o indivíduo com o todo. O indivíduo não é separado do Todo de nenhuma forma. Essencialmente, os dois são a mesma realidade básica que é brahman, o absoluto. Como vimos, as três características básicas, sattva, rajas, tamas, estão presentes no nosso corpo e, ao mesmo tempo, nos objetos, no universo, na criação. A pergunta de Arjuna que inicia o capítulo XVII é um pouco diferente das anteriores, nomeadamente "como devo agir?". Neste momento, a sua preocupação é diferente - Arjuna quer saber o que é śraddhā, a confiança, o acreditar.

Para atingir um objetivo, temos atos para o conseguir. Por exemplo, na tradição védica existe um ritual para dar nome a uma pessoa. Esse ritual tem todo um processo, num templo, com várias etapas para a criança receber o seu nome. Esse nome dá um início e marca um momento. Arjuna diz que existem pessoas que fazem rituais mas não seguem o que as escrituras mandam seguir. Sobre essas pessoas, ele diz que possuem śraddhā, apesar de não seguirem a prescrição da escritura. Arjuna quer saber se essas pessoas são sattva por fazerem rituais, ou, se são tamas por não seguirem a prescrição, ou, se são rajas por terem desejo de alcançar alguma coisa.

Kṛṣṇa explica, como de costume, à sua maneira. Primeiro explica que śraddhā é o acreditar em alguma coisa, a fé, aquilo a que se dá valor. As pessoas agem conforme a sua mente e ela determina o que é importante; assim, é a śraddhā da pessoa e assim é a pessoa. As tendências das pessoas, os seus saṃskāra, são a sua śraddhā.

O tipo de fé que a pessoa tem, independentemente, da sua religião indica a sua śraddhā. Sattva śraddhā é uma fé nos deuses, a devas, a īśvara. Rajas śraddhā é uma fé na satisfação dos seus desejos. Tamas śraddhā é uma fé ligada a fantasmas, desencarnados, para ajuda. O mesmo para a alimentação, tapas e dānam (sattva, rajas ou tamas). Essas quatro ações são escolhidas conforme a sua crença. Pelas ações determina-se a predominância no tipo de pessoa que se é.

No verso 8, Kṛṣṇa fala sobre o alimento sattva e a professora explica a relação entre alimento, yoga e āyurveda. Especificamente, falando sobre alho e cebola são alimentos um cheiro muito forte, e, em excesso, trazem apego (veja-se a forma como o alho cola nos próprios dedos ao ser cortado). Todos os sabores fortes alimentam rajas. A comida sattva é aquele que mantêm a vida, ajuda à clareza na mente (ao contrário do alimento tamas), mantém a força, saúde e bem estar, é suculento, tem um pouco de óleo, tem frescura, é agradável e perfumado.

Se o prato tem todos os sabores cria equilíbrio e traz mais satisfação: doce (como o arroz), salgado, picante (pimenta ou gengibre que mantêm o fogo digestivo e ajudam à digestão), azedo/amargo (iogurte), adstringente (feijão).

A comida rajas é a comida que é muito: quente ou seca ou amarga, picante, salgada... é a comida que se come chorando, ou seja,

Tamas é a comida meio cozinhada ou crua. A comida crua cria Vata no corpo, ou seja, agitação no corpo e mente. A comida muito seca, como o queijo gorgonzola, é tamas. A comida que não alimenta, que não nutre, é tamas. As sobras são tamas. A comida tamas cria tamas [no corpo, na mente].

Sobre o oferecimento, Kṛṣṇa diz que um ritual, ou oração, é sattva yajña e que deve ser feito de uma maneira própria. Deverá ter uma sequência apropriada, adequada, harmoniosa. O ritual é feito sem se pensar no resultado, mas, feito da forma correta com uma mente discriminativa e tranquila. Sobre o rajas yajña Kṛṣṇa diz que é feito devido a querer um resultado. Sobre o tamas yajña Kṛṣṇa diz que é o ritual feito sem se preocupar com prescrição.

Sobre tapas, disciplina, Kṛṣṇa fala sobre a disciplina física, oral e mental. A disciplina física como, pūjā, śaucam, ārjavam (alinhamento), brahmacarya (consciência sobre os impulsos), ahiṃsā (não violência). A disciplina da fala é a atenção ao que é falado, as palavras escolhidas não devem causar reação nas pessoas, devem ser verdadeiras e, ao mesmo tempo, devem ser agradáveis e benéficas, a repetição (japa) e o silêncio (maunam) são exemplos disso. A disciplina mental é o exercício de um pensar claramente, estar tranquilo e atento aos pensamentos, organizar os pensamentos de uma forma agradável (não nutrir pensamentos desagradáveis).

Sobre a disciplina que é sattva, Kṛṣṇa diz que é aquela que deve ser feita. A disciplina que é feita para receber elogio é rajas. A disciplina que é feita para trazer sofrimento ao corpo é rajas.

Sobre dānam, doação, Kṛṣṇa diz que sattva dānam é aquela que acontece quando deve acontecer, quando deve ser dada se a pessoa ou entidade precisar, e que é dada no momento, lugar e à pessoa certa. Tradicionalmente, no momento da entrega diz-se "dātam, dātam, dātam mayā", no sentido "eu dei, agora é seu". A doação rajas acontece devido à espera de um retorno, um resultado (como reconhecimento) e que é dado com relutância. Sobre a doação tamas Kṛṣṇa fala que é uma doação que não tem nada haver com quem recebe, a hora, lugar, recipiente ou forma (com desprezo ou desconsideração) é imprópria.

“Om tat sat” tem a capacidade de neutralizar qualquer erro, obstáculo na execução da ação. Om tat sat são palavras de īśvara, "om" significa tudo o universo físico e causal, o absoluto, pela sua pronuncia está associado todo o conhecimento dos vedas. Tat refere-se ao todo e sat aquilo que é real. O mais importante em qualquer oferecimento é śraddhā, em todas as áreas que haja uma mente mais calma e clareza pois desejo autoconhecimento, isso é sattva.

O que não tem śraddhā é tamas, com o desejo é rajas. Com o objetivo maior, do autoconhecimento é sattva.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Bhagavad Gita, Aula 16 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h01m57s; cânticos iniciais.

Este capítulo tem como nome "daiva asura sampad": a natureza divina e a natureza "demoníaca", num sentido de uma positiva e outra negativa; uma natureza que conduz à liberação, auto conhecimento, e outra que atrapalha o autoconhecimento.

No capítulo XIII foram falados vinte valores como ahiṃsā, kṣānti, ārjavam, e outros, que são valores universais, e, aqui eles repetem-se. Para ter esse conhecimento é necessário ter desejo por ele e discriminação. Kṛṣṇa ao falar dessas duas naturezas: a natureza daiva é a natureza daquela pessoa que assimilou esses valores e a natureza asura é a natureza daquela que não assimilou esses valores. Em criança, não temos um valor pelos valores. A pai e o mãe dizem para agir de determinada forma e é assim que a criança age, pois, se agir em contrario será repreendida. Mais tarde, a pessoa seguirá esses valores se tiver apreendido o valor dos valores, senão irá deixa-los para trás. Por exemplo, por vezes, é mais fácil ou conveniente mentir em determinadas situações da vida. A assimilação desses valores é o entendimento do que faz mais sentido para mim, do que é mais importante. A pessoa que pensa, fala e age deve estar em harmonia, deve ser coerente; nesse sentido, o que eu espero dos outros eu faço, pois esse é o valor que tenho. A pessoa que assimilou os valores é chamada de daivi, e, a pessoa que faz apenas o lhe é conveniente é chamada de asura.

Nos purāṇas existem rākṣasa e asuras. O rākṣasa é aquele que faz atos destrutivos para a humanidade como Rāvaṇa, que é movido pelos desejos do seu ego. Nos purāṇas os asuras são confusos, as suas ações acontecem sob a ilusão, erro. Na Gītā, asura refere-se a uma pessoa que não assimilou os valores. A professora Glória conta a história de Rāvaṇa no Ramayana.

O que faz o daiva é a discriminação, a capacidade de análise e entendimento - sattva. Rajas é o impulso para o desejo e tamas é a confusão - o que faz de alguém asura. Kṛṣṇa falará mais sobre guṇas no capítulo seguinte.

Kṛṣṇa fala sobre as características dos daivas, a sua riqueza:
- jñāna: uma mente com a capacidade de pensar, entender, questionar;
- dānam: a capacidade de dar, uma natureza generosa;
- damaḥ: valor pela disciplina, autocontrole;
- svādhyāyaḥ: valor pelo estudo e meditação diária;
- abhaya: ausência de medo devido à apreciação de īśvara;
- ārjavam: valor pelo alinhamento (o que penso, falo e faço são coerentes);
- ahiṃsā: valor pela não-violência, mesmo no discurso (vāk tapas);
- satyam: compromisso com a verdade, honestidade (para comigo e para com os outros);
- akrodhaḥ: resolver a raiva;
- tyāgaḥ: capacidade de renunciar, abrir mão de um resultado;
- śāntiḥ: valor por estar quieto, ter momentos de reflexão sobre valores, prioridades, si-mesmo;
- apaiśunam: valor por não falar mal sobre as outras pessoas;
- dayā: desenvolver compaixão, empatia (com os outros seres vivos);
- acāpalam - atenção a pequenos movimentos corporais;
- hrīḥ: modéstia, perceber que qualquer qualidade que se tenha não depende exclusivamente de si, é como um presente que se recebe;
- kṣamaḥ: acomodar as pessoas e situações adversas;
- adrohaḥ: ausência do desejo de ferir outras pessoas;
- dhṛtiḥ: enfrentar uma situação com determinação;

Kṛṣṇa fala depois das características dos asuras:
- dambhaḥ: valor por fingir que tem tantas coisas, preocupação em impressionar;
- darpaḥ: arrogância, colocar-se em superioridade;
- abhimānaḥ: opinião de si-mesmo superior;
- krodhaḥ: ser temperamental, brigar;
- pāruṣyam: ironia, desconsideração;
- ajñānam: conhecimento inadequado.

Kṛṣṇa volta a dizer a Arjuna "mā śucaḥ" - não fique triste - pois ele é uma pessoa daiva. Aqueles que continuam aprisionados, os asuras, não têm discriminação e entram nos três grandes portões: kāmaḥ (desejo), krodhaḥ (o valor pela raiva, irritação, agressão) e lobhaḥ (cobiça). Esses três trazem o declínio, a cegueira, à pessoa. São os portões para a ilusão, a autodestruição. Para ser livre desses portões da escuridão e do sofrimento é necessário entender o limite dos objetos, descobrir a paz inerente ao ser, entender o ser fundamental. Vicāra, questionamento/entendimento, é a porta que vai além do portão da escuridão e sofrimento. O conhecimento do dharma é o meio de conhecimento para a discriminação e a ação.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Bhagavad Gita, Aula 15 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h06m00s; cânticos iniciais.

No universo há diferentes corpos, e dentro do corpo há diferentes partes, cabeça, tronco, braços pernas, etc. Olhando, individualmente, todas as pessoas são diferentes; olhando para a base essencial que faz a pessoa a consciência é apenas uma única, isso é comum a todos. Advaita é a visão do Um, uma unidade, única: o meu corpo que vejo separado dos outros é feito dos mesmo cinco elementos básicos que constituem todo o universo. O mundo físico visível, conhecido ou não, é chamado de virat. Todas as mentes pertencem a uma mente cósmica, isso é chamado de hiraṇyagarbha. Fundamentalmente, não existem diferenças entre as pessoas.

No capítulo XIII, falamos sobre o campo e o conhecedor do campo, o universo e a consciência. Neste capítulo, Kṛṣṇa fala sobre o universo visto como uma árvore - esta imagem é usada nos Vedas. Uma árvore é um conjunto inteiro: raiz, tronco, galhos, flores e frutos. A árvore é comparada ao saṃsāra: a raiz do nascimento do indivíduo é devida à ignorância. Assim, a pessoa vai em busca de entender a verdade do mundo "quem sou eu?" e procura libertar-se da roda do saṃsāra, das adversidades e infelicidade encontrando a resposta para a pergunta anterior

A raiz da árvore é o eterno, invisível. Do tronco nascem galhos, folhas, flores e frutos. Nos galhos inferiores e superirores habitam animais, existem ninhos, etc. As nossas experiências na vida ou me levam para uma situação melhor ou pior, para "baixo" ou para "cima", e as nossas ações dão frutos, de sofrimento ou experiências agradáveis. Na upaniṣad diz "num tronco estão dois pássaros: um que se relaciona com tudo o que acontece, saltando de galho em galho, e, um outro que apenas fica parado e observa". Esses dois pássaros referem-se ao indivíduo (jīva) que interage e ao eterno (ātman) que é pleno, imóvel, satisfeito. O pássaro que salta de galho em galho tem que conhecer o pleno, o outro pássaro.

Nessa imagem, as raízes estão para cima, pois a raiz básica é o eterno, ātman, e, os galhos para baixo. As folhas são os Vedas - por onde a árvore respira. Para acabar com a árvore do saṃsāra é necessário descobrir a raiz - não adianta cortar os galhos. A ferramenta para cortar essa árvore é o machado do desapego (vairāgya), ver a realidade do saṃsāra, conhecer o Eu que é livre de nascimento e morte. Esse instrumento (a sādhana), consiste em ver a ilusão relativa à noção de eu e meu: não vendo a minha natureza eterna e essencial eu projeto neste corpo, mente, a minha noção de eu. Depois do apego à entidade, apego-me a objectos relacionados comigo. Livre dessa identificação, desse defeito que é o apego como conhecimento do Eu interno vejo-me livre de desejo pelos objectos como fonte de preenchimento para mim. Dessa maneira, a pessoa alcança o objeto último da vida.

O que é o eterno, Eu? Esse é a Luz, Consciência. O sol não consegue iluminar essa Luz que jamais se torna objeto, nem mesmo a lua, nem o fogo. Essa consciência tudo ilumina e manifesta-se na forma de todo o universo, assumindo formas diferentes - todo o universo nada mais é que a Consciência (īśvara), e, o indivíduo (jīva) nada mais é que uma fagulha dessa Consciência. A Consciência reflete-se nos cinco elementos e na mente que compõe a pessoa, ao longo do ciclo de nascimentos e torna-se necessário descobrir a natureza fundamental.

Aqui, Kṛṣṇa diz que aquilo que chamamos de matéria é, na realidade, Consciência manifesta como matéria.

Nos āśrams, geralmente, este capítulo é recitado antes das refeições e a professora Glória explica o porquê desse costume.

Neste capítulo, Kṛṣṇa diz "eu sou o universo inteiro, os objetos todos, e os sujeitos, os jīvas, o sujeito que come - que faz a ação - e aquilo que é comido - o alimento. (verso 14)." O ato de comer é um ritual sagrado, o sujeito e o objeto tornam-se um único, o mais subtil do que se come tornam-se os pensamentos. Eu sou o que come, o comedor, o sujeito consciente que se alimenta dos objetos e esses objetos externos, as experiências, fazem parte de mim, da pessoa que sou. Aquilo que é não-eu torna-se eu: dois que se tornam um. É īśvara que faz a transformação dos quatro tipos de comida: a bebida, a mastigada, a sugada, e a que se dissolve na boca (ex: mel).

Kṛṣṇa termina dizendo que existem dois puruṣas: o mutável (o universo manifesto) e o imanifesto (em potencial, o desejo, a ignorância) e, ao mesmo tempo, aquele que está alem desses dois, o que lhes confere vida. Assim, na realidade há apenas um verdadeiro puruṣa, a verdade do todo que sou eu.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Bhagavad Gita, Aula 14 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h02m54s; cânticos iniciais.

Foi falado que a causa do universo é brahman, o eterno, além do tempo, a consciência, a base da mente que não está localizada num lugar específico, como no corpo e não está vinculada a ele, mas permite a perceção de todas as coisas, que ilumina tudo e que é o sujeito que permite o conhecimento dos objetos. O sujeito ilumina-se a si mesmo pois a natureza da consciência é de Luz - iluminação - e é autoevidente. A consciência ilumina a mente que, por sua vez, ilumina os sentidos (a luz dos olhos, dos ouvidos, etc). Os sentidos dependem da mente e a mente depende da consciência. Em alguns momentos, a mente apaga-se (como no sono profundo), porém, a consciência, o Eu, ilumina o tempo todo. Quando corpo morre, a consciência essencial que sou permanece, continua a existir, daí que o sujeito não morre, apesar do indivíduo falecer. A morte não acontece apenas no final da vida do indivíduo mas em determinadas fases do crescimento também: para surgir a criança, "morre" o bebé e quando a criança "morre", "nasce" o adulto. Aquilo que Eu sou é Brahman, livre de limitação, eterno, além do tempo e espaço.

O universo aparece devido ao poder de māyā, o poder de criação, o poder de fazer o Um tornar-se múltiplo. Tudo o universo e os objectos têm uma realidade que é chamada mithyā (aparente) que existe enquanto é experenciada e que está em constante mutação. Com o poder de māyā experenciamos a dualidade.

A partir da causa básica que é brahman e o poder de manifestação chamado māyāmāyā , ou prakṛti, surgem objetos, pessoas, pensamentos, ações diferentes. Māyā tem três características básicas, manifestações de três guṇas, invisíveis aos olhos mas que combinadas entre si dão origem ao universo.

Este capítulo XIV é chamado de guṇatraya vibhāga: a divisão em três guṇas. Aqui, Arjuna quer saber sobre a criação do universo. Já no capítulo III Kṛṣṇa diz no verso 27 que toda a atividade de criação é "guṇa". Pela atração e repulsão dos vários objetos há todo o movimento, eu sou atraído por guṇas semelhantes e afasto-me, diferencio-me, separo-me de guṇas diferentes. Daí que, quem faz as ações são os guṇas e sábios são aqueles que conhecem as diferenças entre guṇa e karma, pois, toda a ação é feita pelos guṇas em mim.

Na Índia, fala-se em guṇa em vedānta, yoga, āyurveda, nas artes, etc. A professora Glória faz uma análise dos guṇas:
- Sattva, a qualidade que quando predomina facilita o estudo, a leitura e a meditação;
- Tamas reflete-se por preguiça, falta de clareza, como no final do dia quando o cansaço se instala;
- Rajas está associada ao meio do dia e origina movimento, atividade.

Estas três características existem em todas as pessoas e são importantes na hora certa, daí que tenham associadas certas funções. Para o estudo, deve predominar sattva na mente da pessoa. A professora fala da divisão das castas em relação aos guṇas:
1) Sattva: predominância da capacidade de refletir, estudar, pensar (brāhmaṇa);
2) Raja + sattva: predominância da capacidade de execução, impulso para agir do bem do coletivo, a longo prazo (kṣatriya - governantes)
3) Raja + tamas: impulso para agir e obter ganhos no imediato (vaiśya - comerciantes);
4) Tamas: preferência para agir sob comando (śūdra);

A satisfação ocorre quando a atividade está relacionada com o meu guṇa e o conflito acontece quando a atividade não corresponde ao guṇa (ex: um pensador sobrequalificado para a sua atividade onde apenas recebe ordens ou um comerciante sendo um político).

Um bebé é, predominantemente, tamas (imóvel), a criança/jovem rajas (impulso) e o adulto sattva (pensa). Em determinadas alturas da fase da vida de uma pessoa, a característica predominante pode ser indesejada e a compreensão que os guṇas afetam a pessoa tornam a vida mais fácil. Deve-se trabalhar para uma mente mais sattva para o estudo.

As três características também tem as suas limitações:
- sattva tem a capacidade da mente de refletir com objetividade, sem tristeza ou depressão, mas tem apego a coisas confortáveis, organizadas, à lógica e clareza e repulsa por rajas e tamas, pelo sentimentalismo;
- rajas apega-se ao desejo, a karma e reage a situações diferentes onde a imobilidade permanece;
- tamas tem apego/limitação à preguiça.

É necessário aceitar as pessoas como são, com as suas diferenças. Ao ver essas características em nós tornamo-nos mais tolerantes com os outros e colocamos sattva/discriminação na nossa vida. Quando na mente há Luz, sabe-se que é sattva que predomina, quando há desejo ou ambição atividade é rajas que domina, quando há falta de impulso a mente está tomada por tamas. No final da vida, o guṇa (valor/atividade) presente é o que condiciona uma próxima vida.

Sábio é aquele que não reage há presença dos guṇas, pois ātman é livre dos guṇas. Guṇa é para a mente, a criação, o universo. "Eu sou livre dos guṇas" é o conhecimento do sábio que não reage à sua presença, não se apega a eles, nem deseja um deles. O sábio entende que a vida é um movimento constante dos três guṇas.

terça-feira, 1 de março de 2011

Bhagavad Gita, Aula 13 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h05m42s; cânticos iniciais.

Estamos na terceira e última secção da Gītā, que compreende os capítulos XII a XVIII. A Gītā segue o mahavākya (grande afirmação) "tat tvam asi" que é a essência do ensinamento do vedānta, por isso, denominado também de upadeśa vākya (frase de ensinamento). Tat Tvam asi significa você é Aquele. Alguém diz a outra pessoa: aquele īśvara você é: o indivíduo, limitado, afinal é igual ao Todo, o universo. A verdade do Eu é a mesma verdade do Todo, além da forma, da aparência do corpo e da mente. Torna-se necessário entender "Tvam" (você), "Tat" (īśvara, a causa), e "asi" (a identidade entre os dois". Nos seis primeiros capítulos falamos de tvam, do capítulo VII ao XII falamos em detalhe sobre īśvara e agora começa o discurso sobre a identidade entre os ambos.

O capítulo XIII é chamado kṣetra kṣetrajñam. "Kṣetra" significa campo e "kṣetrajña" significa conhecedor do campo. Campo pode ser um lugar onde se planta alguma coisa, todo o universo, onde ocorre uma ação e o resultado da ações, e, que pode ser objetificado. No texto drg drish viveka este tema também é abordado.

Arjuna deseja conhecer puruṣa e prakṛti. Puruṣa é ātman, o que sou e prakṛti é a natureza, tudo o que é conhecido. O campo é prakṛti e o conhecedor do campo é puruṣa. Arjuna não conhecia estas palavras, daí a pergunta.

Kṛṣṇa responde que kṣetra é este corpo que está aqui. Arjuna tem a sensação que o campo começa depois do corpo, mas não é. O corpo, a mente, as emoções e todos os objectos são o campo. E o conhecedor do campo é aquele que vê, que conhece isso tudo - esse é o sujeito, aquele devido ao qual os meus olhos vêm, os ouvidos escutam, a mente pensa (o ouvido do ouvido, o olho do olho com refere a Upaniṣad). Existe um sujeito que ilumina os sentidos e Eu sou esse sujeito.

A professora Glória dá a ilustração de um pote com cinco aberturas (cinco órgãos de percepção) e uma lamparina dentro que ilumina através das aberturas, comparando com o corpo e a consciência que torna a mente consciente. Essa consciência é a mesma consciência de īśvara, a consciência é sempre sujeito, uma única, que parece múltipla, sem forma específica, livre de limitação, imóvel, não-divisível.

Como eu sinto-me limitado, essa consciência parece estar distante mas aquilo que busco já sou eu.

Kṛṣṇa diz: "Essa consciência que é você é a mesma consciência que é o todo, que é īśvara, essa consciência sou eu. Da mesma maneira que todos os objetos de argila provêm do barro, todos os objetos do universo provêm de mim. Eu sou todos corpos, pés, olhos, cabeças, bocas, ouvidos das pessoas mas, ao mesmo tempo, eu sou livre e independente de todos os corpos. Eu sou a Luz de todas as luzes, além de qualquer escuridão. Eu sou todo o conhecimento e o meio para o conhecimento."

Kṛṣṇa continua: "Puruṣa, o sujeito, a consciência, é aquele que tudo permite, que permite ver, discriminar, emoções, percepção, sem gostos e aversões, que sustenta tudo, que dá vida ao corpo, é o Eu maior que está sentado no corpo, completo, nem dentro nem fora, mas, em todo o lugar."

No capítulo XIII, são dados os vinte valores que deram origem ao livro de Svāmi Dayānanda Sarasvatī chamado "O Valor dos Valores". Se se estudou até aqui é normal uma certa quantidade de śama e dama, algumas qualificações, dharma (papel/valores). No entanto, Arjuna parece não conseguir entender completamente esse ensinamento. Porquê? Ele deseja saber mais sobre os meios para atingir o conhecimento - o tipo de mente - e, assim, Kṛṣṇa fala sobre as qualificações necessárias do sétimo ao décimo primeiro verso. Note-se que ao focar sobre uma das qualificações as outras também vão chegando. Estas qualificações trazem uma simplicidade, objetividade e tranquilidade, sem que se fique preso ao passado, sem falsidades nem complicações. Quanto mais esse valores estiverem claros maior é a capacidade de aceitação do mim mesmo e do universo.

Amānitvam - ausência de exigência de respeito pelas outras pessoas. Assim não espero do mundo, das pessoas reconhecimento do meu valor. Não necessito de elogios apesar de possuir qualificações;
Adambhitvam - ausência de necessidade de reconhecimento de um valor ou qualificação que não possuo (pretensão);
Ahiṃsā - não violência em termos de palavras, atos para qualquer outro ser. Sensibilidade para me colocar no lugar do outro. Não infligir sofrimento desnecessariamente;
Kṣānti - capacidade colocar o coração do tamanho do universo e acomodar as pessoas da maneira que são;
Ārjavam - o alinhamento em relação à mente, fala e ação. Coerência com o que se pensou, disse e fez;
Ācārya upāsanam - o respeito à pessoa que ensina que representa o ensinamento, os Vedas;
Śaucam - pureza e disciplina ao redor (organização);
Sthairam - firmeza, uma vez decidido vou até ao fim;
Ātmavinigrahaḥ - capacidade ter uma disciplina sobre mim mesmo;

O discurso sobre valores é longo, por isso, a professora Glória faz apenas um resumo destes primeiros.

Quando abraço esses valores eles trazem uma paz, e, quando eles não estão claros eu torno-me uma pessoa mais difícil de lidar. Com esses valores eu posso descobrir aquele que Eu sou - a Paz.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 12 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 57m45s; cânticos iniciais.

Do capítulo I ao capítulo VI o tema fulcral é o indivíduo, karma yoga, renúncia e meditação; estes seis capítulos falam sobre īśvara, a causa da criação, o todo, a sua forma (não específica) mas como todo o universo, a sua natureza e como o posso compreender; ou seja falamos de jīva e īśvara.

Jīva é um ser na natureza, īśvara é a inteligência por detrás da criação, do corpo, a ordem do universo, a causa material e inteligente.

A Gītā mostra que sempre nos parecem diferentes, na verdade, não são diferentes, apesar da experiência de dualidade que toda a gente sente. Essa afirmação da não-diferença entre indivíduo e criador é como que uma ousadia - só existe um ser! Para explicar essa ousadia temos este conhecimento. Como no sonho em que temos a experiência de dualidade entre os vários personagens e ao acordar, sabendo que os personagens da sonho era eu, vê-se a dualidade como apenas uma única realidade, neste caso, criada pela mente. Eu não posso dizer isso enquanto estou a sonhar, já que, vivo a dualidade mas, ao despertar, eu posso dizer que aquilo era falso, aparente - os pensamentos sou eu.

Em relação ao universo, os Vedas dizem a mesma coisa. Por isso, são chamados de sábios os que conhecem esta verdade. O universo não é não-existente, é aparente, parece real. Acordar para uma outra realidade é a proposta de Vedānta - o indivíduo e o Todo são idênticos, fundamentalmente. Da mesma maneira que uma onda, que se vê isolada, com nascimento manifestação e morte se vê diferente do oceano, que é o Todo. Se essa onda pudesse perceber, descobriria "eu sou água, portanto, sou não diferente de todo o oceano, somos um único, eu existo no oceano, não sou separada; a verdade essencial é a mesma, não diferente". Ou seja, o conhecimento é "Eu sou eterno, sat, cit, que existe sempre, eu sou imortal assim como esse Todo; só existe o Todo, não existe indivíduo. O Todo abarca todos nós."

Com esta visão, eu cumpro o meu papel neste esquema de coisas, pois, sei que é o que deve ser feito por mim. O que me impede de agir assim é o ego - a sensação de uma realidade independente, diferente, separado do Todo, como alguém que tem o poder de determinar, totalmente, a sua própria vida.

Neste capítulo, apelidado de devoção, Kṛṣṇa não quer falar sobre a necessidade de desenvolver devoção, mas, fala da devoção como uma consequência. Nos momentos de sensação de não-separação obtemos essa clareza e essa apreciação. Nenhum ato é devoção, devoção é o entendimento, e o ato devocional é uma expressão do entendimento. No reconhecimento da real identidade do indivíduo a mente dissolve-se no Todo.

Chama-se de karma yoga quando cada um contribui fazendo o que é necessário ser feito. Ao não contribuir com o meu dever acontece aquilo que a professora contou anteriormente numa história acerca do copo com leite pedido a cada aldeão e em que todos contribuíram com água pensando que o seu pouco de água seria diluído no leite que os restantes iriam contribuir. Acontece que todos pensaram o mesmo e apenas água foi recolhida, quando o que era necessário era leite.

Quando aprecio o Todo torno-me um devoto, livre de raiva e reação, tenho a capacidade natural de aceitar e apreciar o universo todo como ele é, porque, consigo perceber uma ordem nele. Nesta līlā, neste jogo/teatro, cada indivíduo tem o seu papel. Se eu vejo o universo como uma peça, eu posso apreciar tudo isso pela grandeza do espectáculo que é. Cada um assume vários papéis e age de determinada maneira consoante as situações. Como, por exemplo, a pessoa que é cidadão de um país, chefe de uma equipa, pai de família, vizinho, etc. Cada situação exige um papel específico da mesma pessoa sem que ela os confunda. Não posso dizer que esses papéis não sou eu, porque eles estão "pendurados" em mim, mas tenho de saber que fundamentalmente sou livre dos papéis, e não sou esses papeis. Eu estou livre dos papéis mas, ao mesmo tempo, eu dou vida aos papéis. A pessoa fundamental é ātman que é livre. Eu descubro o Todo e a atitude que nasce é a devoção, a apreciação. A devoção é aquilo que este capítulo aborda.

Entre as pessoas que fazem a ação e os que se dedicam ao conhecimento Kṛṣṇa diz: "aqueles que conduzem a sua mente em Mim, sempre ativos meditam, e ao mesmo tempo têm uma apreciação por Mim são consideradas como mahayogi". Considerando que Arjuna pergunta se a renúncia ou karma yoga é melhor Kṛṣṇa responde dizendo que karma yoga é melhor, pois, se Arjuna tivesse o conhecimento não questionaria, pois a renuncia não precisa ser feita com o retiro para um lugar isolado e sem ações. Como meditar no Absoluto é difícil, caso não haja um preparo da mente, é necessário karma yoga para se manter livre de reações e apegos para entender melhor esse conhecimento.

No verso 25 do capítulo IX, Kṛṣṇa diz: "qualquer coisa que Me ofereças, uma folha, flor, fruto, seja o que for, com devoção (amor) - com a apreciação da não diferença com o Todo - nem que seja mentalmente, Eu recebo". Este é considerado o ato de ofertar.

A professora Glória fala de karuna, compaixão, empatia no sentido de acolher o outro que surge quando Eu vejo o Todo e acolho o universo com compreensão pela pessoa, observando o dharma, defendendo o que é correto e fazendo o que for possível para ajudar.

Como karma yogi faço a ação e recebo o fruto - devoção é karma yoga.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 11 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h01m59s; cânticos iniciais.

Análise dos capítulos X e XI.

Apesar da experiência do sujeito ser de limitação, por vezes, o indivíduo tem a experiência da plenitude, totalidade. O sujeito identifica-se como mortal, perecível, mas, em vários momentos, vê-se como completo. Em Vedānta, fala-se sobre esse conhecimento, sobre a totalidade. Arjuna reclama que esse conhecimento não está claro para ele. Kṛṣṇa fala-lhe sobre karma yoga, um estilo de vida específico, que consiste em não mudar a ação mas a atitude - passar a ter prasāda buddhi, receber o que chega como uma benção e saber que o que chega é exatamente o que devo receber. Essa atitude traz tranquilidade e é fundamental para que eu possa descobrir que "eu sou a paz, a fonte de qualquer felicidade experenciada, o silêncio, ātman, a verdade de tudo o que existe". Tenho de ter a capacidade de aceitar, acomodar as pessoas como elas são, sem reação. E, ao mesmo tempo, entender, apreciar īśvara - a causa material e inteligente do universo. Kṛṣṇa procura fazer Arjuna entender isso, neste momento.

Com esta visão pergunta-se agora "o que é meu?"

O "meu" é um conceito na mente, não tem realidade nenhuma, não tem conteúdo pois a pessoa apodera-se de um objeto durante um período de tempo e passa a chama-lo de "meu". Até mesmo o corpo veio dos cinco elementos e a eles retorna. O corpo pertence à terra, água, fogo, e outros elementos, e, eu não sou autor nem dono dele, pois eu não tenho poderio sobre ele. Os pais também se consideram donos dos filhos - "meu" filho; e por conseguinte, os filhos acham-se donos dos pais - o "meu" pai, a "minha" mãe. No próprio corpo, existem outros seres, bactérias que habitam à várias gerações este lugar.

Então, a quem pertence o corpo? Ao Criador, aos cinco elementos.

Nem mesmo a emoção é minha, pertence à ordem psicológica que é īśvara. Tudo o que é conhecido e desconhecido é īśvara e pertence a īśvara. Tenho de ver esse universo como a Sua expressão. Arjuna quer ver o Todo e pergunta como o pode ver. Kṛṣṇa diz-lhe que a própria inteligência é Ele, qualquer capacidade, dom, e mesmo o medo e a ilusão. Daí que, tradicionalmente as músicas são dedicadas a īśvara e a Dança ocorre frente a um altar, pois a capacidade de dançar pertence a īśvara. Diz também que em alguns lugares, objetos ou coisas Ele poderá ser visto com mais facilidade pois está mais evidente, como um legume maior que o normal (que geralmente é ofertado no templo), a cor do oceano - nessa visão o indivíduo perde a noção dos problemas e vê a grandeza de uma beleza incrível. Por alguns segundos, essa coisa proporciona um samādhi, perde-se a noção de estar separado, eu e o mundo, a dualidade. Por esse motivo, todas as tradições têm peregrinações a lugares especiais, simbólicos que engrandecem e que proporcionam esses momentos de saída da sensação de limitação. Kṛṣṇa enumera, de seguida, lugares especiais, na Índia, que proporcionam esse efeito - a essência desse ensinamento diz que em qualquer lugar do mundo onde a beleza, a grandeza, seja maravilhosa leva a um encantamento e a uma experiência de algo a mais. Kṛṣṇa diz que, entre os seres celestes, é a Lua, o Sama Veda, canto védico, Rāma, o elefante, o rei (que protege o Dharma e governa com justiça), o vento entre os purificadores, e qualquer lugar onde se veja vibhūti, poder, ou riqueza maior.

No início do capitulo XI, Arjuna pede a Kṛṣṇa para ver a sua forma cósmica, se for merecedor.

Kṛṣṇa quer que Arjuna veja a sua forma em tudo, e perceber a presença do Todo como uma única coisa, uma única realidade. No entanto, Arjuna quer ter esse experiência e Kṛṣṇa mostra-lhe essa forma cósmica. Nesse corpo aparece todo o universo. Quando Arjuna vê todo o universo fica nervoso, pois vê o universo todo ao mesmo tempo, Bhīṣma, Duryodhana e ele mesmo na batalha, a matar, o bonito e o feio, o encantador e o apavorante. Assustado, Arjuna pede a Kṛṣṇa o favor de voltar à forma normal. Kṛṣṇa volta à forma formal e refere que os sábios podem adquirir essa visão cósmica apreciando que só existe Um, só existe īśvara e nada separado do Todo.

Bhagavad Gita, Aula 10 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h07m28s; cânticos iniciais.

Do capítulo VII ao capítulo XXII, a Gītā fala de īśvara, a causa do universo. No capítulo anterior, Kṛṣṇa fala sobre brahman e define brahman - aquilo que é akṣaram, param, imutável, eterno, a natureza essencial de tudo o que existe, a base da criação. Neste capítulo XIX, ele fala de ātman, o Eu - a natureza essencial do indivíduo - mas através de īśvara.

A consciência não está localizada num lugar, não tem um início, nem fim, é além de qualquer medida, é independente do tempo, chamada de Brahman, é ātman. Eu vejo-me como o corpo, o pensamento, emoções, vejo-me limitado, carente. A visão do Eu da Gītā e de Vedānta é diferente e Kṛṣṇa quer transmitir essa visão. Aquilo que é o Eu é o Eu em todas as pessoas, em todos os seres, apesar de corpos, mentes ou intelectos diferentes - o sujeito é um único e sempre o mesmo. Então o ātman é brahman, livre de limitação e isso é preciso ser reconhecido. Esse ātman que é brahman é a causa da criação, então ele é īśvara - a verdade da criação - a causa inteligente e a causa material da criação.

Daí que, este capítulo seja chamado de rājavidyā - o conhecimento real, o conhecimento superior. Este conhecimento deve ser dominado, pois essa é a base do nosso relacionamento com o mundo, já que, o Eu é a base inclusive para o meu relacionamento comigo mesmo. A visão de um Eu eterno não é reconhecido por mim, à partida. Este conhecimento também é chamado de secreto (rājaguhya), pois não será entendido se não houver um preparo, um desejo, uma maturidade e, assim, estar pronto para entender plenamente. O segredo é sobre esse Eu que é livre de limitação, a base de tudo, contrário àquilo que eu tinha concluído sobre mim.

Eu posso ter uma experiência incrível, como a experiência de samādhi, ter uma experiência transcendental de advaita, através de yoga, de prāṇāyāma e que nivela tudo, em que todas as barreiras entre sujeito e objeto são quebradas. Essa experiência não resolve o meu problema de dualidade, de me sentir carente e limitado e assim, a experiência não transforma nada. Kṛṣṇa quer mostrar que apenas o conhecimento revela o ser eterno que sou, que já existe, que é realidade. Eu não vou produzir o eterno, mas reconhecer o que já sou - isso é rājavidyā. O conhecimento chamado de um meio de purificação, reconhecer que Eu já sou eterno, puro.

Os objetos não têm uma realidade independente, todo o universo depende da consciência e nada existe fora dela. Todo o universo de nomes e formas é sustentado através de ātman, a consciência sem uma forma específica, mas, que assume uma forma a partir da sua base.

A professora Glória dá vários exemplos para exemplificar este conceito, como o pote que existe na argila e a argila que existe em várias formas diferentes sem ser pote - a forma (pote) depende da matéria mas a causa (argila) não depende da forma (pote), da forma, comparando com o que Kṛṣṇa diz: "todos os objectos que existem estão em Mim (consciência) mas eu não estou neles" - o Absoluto não depende do universo, mesmo sem ele, o Absoluto é.

Desta maneira, o Absoluto é real, o universo relativo é aparente, pois depende do primeiro. Como os papéis que dependem de um ator, e que os espetadores chegam a confundir com a personagem que o ator desempenha. O universo não tem realidade própria, absoluta, depende de Mim, é relativo, pois o único que é absoluto é ātman, aquilo que Eu sou - esse é o poder de īśvara, o poder (yoga) de fazer aparecer, como que por magia, denominado "māyā". Isto não é facilmente percebido pela mente, pois ela mesma também é um produto de māyā. Conhecendo Este, tudo o mais será como que conhecido.

Neste capítulo, tem um verso especial, muito bonito, o verso 22, que marca o meio da Gītā, dos seus 700 versos. Refere que o que é necessário para entender isto é ter a visão clara de rāga/dveṣa, da reação, da rejeição e ter uma mente calma, tranquila; pois īśvara é o karmaphaladatṛ - aquele que dá os frutos da ação. Trata-se necessário apreciar a Ordem e receber o que com uma nova ação sem estar preocupado com yoga (aquisição daquilo que eu não ainda não tenho: reconhecimento, etc) e kṣema (manutenção do que já foi conquistado), já que, essa mesma Ordem toma conta delas. O meu controle está apenas na ação, e, eu devo agir. O fruto vem pelas leis impessoais - o resultado da ação vem Dele - essa é a atitude de karma yoga que torna a obtenção do conhecimento mais fácil e evidente.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 9 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m24s; cânticos iniciais.

Do capítulo VII ao capítulo XII, o tema é a compreensão de īśvara. No capítulo anterior, o sétimo, falamos de īśvara como causa inteligente e causa material da criação.

O capítulo VIII é chamado de tāraka brahman ou de akṣara brahman, tem esses dois nomes. Tāraka brahman quer dizer aquele que me ajuda a atravessar, ir além - do saṃsāra (a vida de altos e baixos, de sofrimento). Akṣara brahman é aquele que é imutável, o absoluto, a verdade do universo que é o sujeito. Este conhecimento de tāraka brahman fala sobre a identidade (igualdade) entre o indivíduo e o todo.

Arjuna começa com o questionamento sobre a hora da morte: o que pensar nesse momento?

Kṛṣṇa fala sobre akṣara brahman como o imutável, sem forma. Brahman vem da raiz bṛh, raiz que significa "ser grande" (no sentido de maior de todos) na forma neutra, e na forma masculina como o criador. Brahman, junto com o poder de fazer aparecer, māyā, faz toda a criação. O indivíduo tem um corpo físico, um corpo subtil (pensamento e emoções) e um corpo causal (puṇya/pāpam) - (īśvara físico é chamado de jagat, īśvara subtil é hiraṇyagarbha) Causal é o não manifesto, semente, (avyakta). Kṛṣṇa diz a Arjuna que se pensar Nele estará livre. A questão é: como pensar Nele? No momento da morte, a força vai-se, por isso, só é possível pensar em īśvara se já houve uma disciplina, e deverá pensar-se "somos um, não somos separados" - isto é preciso estar claro e estabelecido. Se não houve uma vida de Yoga, no sentido de implementar este conhecimento, no momento da morte, outras questões irão tomar conta da mente.

A professora fala sobre o filme Malika para ilustrar o tema da reencarnação.

Os pensamentos que se tornam mais fortes manifestam-e numa próxima vida como tendências. Não tire da sua mente a verdade sobre o sujeito "aham brahman" - eu não sou corpo, eu não sou mente, eu sou o universo, a consciência. Isso quebra ciclo de renascimentos. Assim, é preciso manter a disciplina de meditação e contemplação (abhyāsa) da visão da unidade com o absoluto. Durante o dia, quando a mente está livre, é necessário ver sob a perspetiva do absoluto, mesmo observando um problema relativo; e praticar a capacidade de ver, amplamente, que eu não controlo nada e abro mão, e permitindo que īśvara faça a sua parte, pois ele já o faz verdadeiramente, mas, na minha mente eu não o vejo. Com essa visão, esgota-se a bagagem para um novo nascimento e, assim, não há um próximo nascimento. Dessa forma, esse jīvanmukta, liberado vivo, torna-se um videha mukta - sem corpo causal para originar um novo nascimento. Há uma outra opção: kramamukti aquele que deseja a libertação através do conhecimento vindo do melhor professor, ou seja, brahmājī. Assim, procura alcançar brahmaloka através de várias disciplinas de yoga. Nesse lugar, aguarda o final da criação e recebe o conhecimento diretamente do criador - assim alcança o conhecimento e liberta-se.

Outra opção, é o controle de várias disciplinas de prāṇāyāma - que comandam a mente - e da repetição, ao mesmo tempo, do omkāra em formato de japa, a repetição do mantra om. Com essa disciplina diária rigorosa, focando o olhar no centro das sobrancelhas, para que o prāṇa, no momento da morte, saia pelo topo da cabeça (sahasrāra cakra), alcança-se brahmaloka.

Esse é o objetivo último de todos - brahman. O objetivo final de todas as pessoas é Om, esse Om é brahman. Conhecendo o significando do Om, meditando no Om, alcança-se o Om - "eu sou Om". Īśvara praṇidhāna é o conhecimento de jīva como īśvara, ou, de jīva como ātman.

A seguir, Kṛṣṇa fala sobre tempo relativo e daquele que está além do próprio tempo. Durante a vida, deve-se focar esse eterno para que no momento final da morte esse pensa surja e se termine com o saṃsāra cakra.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 8 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 57m26s; cânticos iniciais.

Se existe uma libertação, uma liberdade, livre de limitação, essa tem que ser a natureza do sujeito "eu já sou completamente livre", não pode ser alcançar algo que seja eterno, pois, dessa forma não será um descobrir uma realidade já existente. A visão de limitação em termos de tempo e espaço, uma identificação com o corpo, a mente e as emoções é, em si mesma, a limitação - essa visão é contraria à visão de Vedānta, do śastra, de Kṛṣṇa.

Essa visão soa como algo verdadeiro, porque, em vários momentos da vida temos essa experiência do ilimitado.

Este foi o assunto dos seis capítulos anteriores. Entramos agora na parte de estudo sobre īśvara.

Tudo o que vejo no universo parece ter uma razão de ser, ter uma lógica. Se tenho fome existem objetos para saciar essa fome, para respirar estamos munidos com órgãos para o fazer, a própria chuva afeta e relaciona-se com todos os seres, plantas, oceano, nuvens... há uma ordem, uma inteligência, na criação. Para complementar o entendimento sobre mim mesmo, quero saber quem está por detrás dessa criação, quem é o responsável por esse universo todo?

Analisando a causa de um objeto chegamos em duas causas: a material e a inteligência por detrás (upādāna kāraṇa e nimitta kāraṇa). Por exemplo, uma mesa tem a madeira como causa material e a sabedoria de alguém como causa inteligente. Há uma razão de ser para tudo, um porquê, tudo é relevante e tem uma inteligência - como as cores específicas de cada tipo de flor ou animal.

O original dos Vedas é dizer que a causa material e inteligente do universo é a mesma. Normalmente, eu penso que um objeto tem uma causa material separada da causa inteligente, como por exemplo, ao comprar uma mesa eu apenas trago comigo a causa material. Assim, em relação ao universo eu julgo haver um criador separado, que está algures no Céu.

Os Vedas dão o exemplo da aranha, que é a causa inteligente e material da teia, para demonstrar que īśvara - o criador - não se separa da sua criação nunca, o seu corpo é a criação, assim como no sonho eu sou a causa material e inteligente do sonho que estou a sonhar.

Esse assunto não é uma causa de crença pois esse universo inteiro tem que ter uma causa, apesar de eu a desconhecer. Se não houvesse causa não existiria efeito - o universo. Que causa é essa e onde está? Esse é o estudo de Vedānta.

Esse Todo é da mesma natureza que Eu, daí que, Eu sustento esse universo. Se īśvara é a causa desse universo, onde esse universo está, está esse īśvara. Todas as formas pertencem a esse criador. Todos os elementos subtis e densos, pensamentos e emoções, e ainda, o imanifesto - parā prakṛti (natureza superior, eterna e livre de limitação, ou seja, puruṣa) e aparā prakṛti (natureza inferior, ou seja, os elementos, as formas). Os objetos e corpos e a própria vida - a consciência que dá realidade a tudo. O jīva é uma parte desse todo. Assim, para me relacionar com o Todo, numa pūjā, por exemplo, eu escolho uma forma simbólica (ex: Ganeṣa). Eu posso dizer "todo o universo existe em mim porque esse "mim" é Consciência, ou, que todo o universo é sustentado por mim, o puruṣa". Com esse entendimento posso também dizer "aham brahmāsmi" - não existe separação entre mim e o todo, ela é aparente - como a divisão entre onda e oceano (a onda nada mais é que água, a verdade do próprio oceano).

A consequência nessa visão de īśvara é a compreensão que me permite ver a ordem em tudo, no corpo, na mente, nos frutos da ação vindos de leis impessoais e infalíveis. Daí que uma semente trará um determinado fruto específico e não um outro fruto qualquer. Com esta visão, eu posso relaxar e confiar pois não existe injustiça mas somente ordem e receber o resultado que chega. Não sendo aquilo que eu desejo eu posso fazer uma nova ação para modificar. Neste modo, eu posso relacionar-me com o Todo.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 7 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h06m59s; cânticos iniciais.

Análise do capítulo VI. A Gītā divide-se em três partes, três conjuntos de seis capítulos. O primeiro conjunto debruça-se sobre jīva (o indivíduo) que se vê limitado e tem que descobrir a sua verdadeira natureza que é livre da ação, akarta. O primeiro conjunto analisa ainda o yoga e o meio sobre como preparar a mente dessa pessoa.

A causa do sofrimento é a ignorância da sua verdadeira natureza que leva a pessoa a identificar-se com aquilo que não é - essa é a ilusão. Ao longo do tempo torna-se um hábito olhar para mim mesmo como limitado, infeliz. Torna-se uma tendência através da repetição, uma vāsanā.

É dito também que uma mente contemplativa é necessária para uma vida de renúncia.

Agora, Kṛṣṇa fala sobre meditação: renunciar não é uma ação, um ato nem físico nem mental, e uma maturidade um estado de estar livre. A meditação ou contemplação é o mesmo, não é uma coisa que se faça. Sentado, posso fazer prāṇāyāma, prāṇa vīkṣaṇa, japa, etc mas não necessariamente estou a meditar/contemplar, porque contemplar é uma capacidade de perceber, ver, a minha natureza fundamental independentemente de qualquer pensamento.

Kṛṣṇa quer dizer que o foco não é renunciar nem meditar, mas adquirir meios para estes possam acontecer naturalmente. Da mesma maneira que amar tem de ser espontâneo e não forçado, meditar ou renunciar deve surgir sem esforço, a partir do conhecimento. Uma vida de Karma Yoga vai-nos levar a uma mente contemplativa, tanto no momento da ação como na hora de receber os frutos (sem reação).

O capítulo VI fala sobre meditação/contemplação para se entender o significado da expressão "tat tvam asi" (jñāna niṣṭhā) e tornar o que foi escutado como conhecimento - diferente de uma mera experiência. Torna-se necessário entender a veracidade das palavras "Sat", "Eu" e "Pūrṇam" como não apenas a experiência de uma felicidade ou de um evento efémero, mas, para eliminar o que está a atrapalhar o conhecimento claro, como dúvidas, enganos ou falta de clareza.

Arjuna não queria ser um Karma Yogi mas renunciante pois parece ser algo melhor, e, ele também o desejava. Kṛṣṇa diz que renunciante é aquele que faz o que deve ser feito livre do resultado da ação - um renunciante tem que ser um karma yogi e um karma yogi tem que ser um renunciante, já que, um renunciante não é aquele que abandona tudo. O renunciante tem que ter uma mente similar ao de um yogi - uma mente com equilíbrio, preparo, firmeza e sem reação (śama e dama).

Aquele que conquistou Yoga consegue renunciar a qualquer coisa que acontece na sua mente - sarva saṅkalpa sannyāsī. Para isso, é necessário perder o hábito de olhar para si mesmo para baixo "eu não sou capaz, eu não consigo, eu sou infeliz" e levantar a visão de si mesmo, caso contrário a mente é o inimigo. A mente que está conquistada é a mente amiga.

A professora Glória conta a história da pessoa pobre que, subitamente, fica rica e ilustra como ela lida com uma situação inesperada utilizando os velhos hábitos, os padrões, que vêm à tona no momento. A meditação tem por finalidade criar um momento em que eu possa ver com clareza a plenitude que já é a minha natureza, a paz que eu sou, para que na hora em que preciso de lidar com as situações, internamente, eu possa entender a reação e trazer à mente a visão de mim mesmo como pleno. O maior momento de meditação é quando as situações ocorrem e a reação, na mente, contrária ao conhecimento, surge. Daí que, é em Karma Yoga, no meio das ações, que eu posso lidar com isso.

Arjuna aceita isto, mas diz a Kṛṣṇa que a mente dele é obstinada, poderosa, mais difícil de controlar que o vento. Porém, Kṛṣṇa concordando que a mente possa ser assim, tanto a de Arjuna como a dele mesmo, argumenta que com paciência, carinho, atenção, abhyāsa e vairāgya torna-se possível controlá-la.

Antes do final do capítulo, Arjuna pergunta o que acontece se morrer antes de conquistar o conhecimento. Kṛṣṇa diz-lhe que a próxima vida será uma continuidade desta, por isso, não precisa de se preocupar e pode continuar a vida de Yoga - seja um yogi, com uma mente discriminativa, contemplativa e a vitória será sua.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 6 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m53s; cânticos iniciais.

Logo no primeiro capítulo Arjuna procurou fugir à ação, Kṛṣṇa ensina a Arjuna que a melhor ação é a de Karma Yoga. A presença de rāga/dveṣas e suas reações é que são a causa do sofrimento; a ação em si não é um problema que se resolva com a não ação. A solução, não é deixar de fazer, mas lidar com a causa da reação. Arjuna pensa que a ação é o problema e que não agindo não irá criar problemas. No entanto, a questão é aprender a lidar com a ação e a reação.

Entretanto, Kṛṣṇa fala de dois estilos de vida para mokṣa: a renúncia e Karma Yoga - os dois para a mesma coisa. O mestre quer mostrar ao discípulo que o seu caminho é o de Karma Yoga.

No capítulo anterior, Kṛṣṇa tenta mostrar a Arjuna que pode renunciar não fazendo a ação ou não se identificando como o agente da ação.

A não-ação é um estado de ser, não uma opção. A única opção é perante a ação: uma ação correcta, inadequada, ou não faz a ação, porque a sua natureza é de kartā. No capítulo IV fala-se de não-ação como a descoberta de "eu por natureza não faço nada, nunca fiz nada nem poderei fazer, porque a minha natureza é consciência, o absoluto que não tem para onde ir ou fazer, é uma presença". Este estado tem que ser descoberto.

A renúncia pode ser de três tipos:
a) a renúncia como um estágio na vida - vividiṣā sannyāsa;
b) aquele que já adquiriu o conhecimento "eu sou brahman" tenha tomado, ou não, formalmente sannyāsa - vidvat sannyāsa;
c) renúncia na hora da morte - āpat sannyāsa.

A professora Glória conta a história do sábio talhante.

Arjuna desejava a primeira forma de renúncia mas Kṛṣṇa impele-o à segunda, pois esse é o sábio. Como é possível tomar sannyāsa para adquirir conhecimento Arjuna deseja isso. Acontece que ao tomar sannyāsa ficamos privados de confrontar as nossas rāga e dveṣas. Por isso, entre os dois estilos de vida, Kṛṣṇa diz que Karma Yoga é muito melhor que karma sannyāsa (renúncia). Como isso não era o que Arjuna queria ouvir ele age como se não tivesse sido dito.

Kṛṣṇa fala que o sempre renunciante, livre de reação (raiva, aversão), do desejo e capaz de lidar com as dualidades, facilmente, liberta-se de todo o aprisionamento. Renunciante não é aquele que está num lugar isolado, sem fazer nada, mas aquele que está livre de reação com uma mente tranquila. Se não existe um estilo de vida naturalmente de renúncia para a pessoa, a melhor coisa é buscar ser um vidvat sanyāsī.

A professora conta a história de Kailāsa āśram onde se ensinava sobre sannyāsa aos sanyasis, falando dessa como a melhor opção para aqueles que já estão nesse caminho, que têm uma vida simples. Muitas vezes, o uso da roupa tradicional de um renunciante pode tornar-s um motivo de orgulho - ideia contrária à própria renúncia. Àqueles que já têm família, filhos, profissão, etc, não adianta estar a elogiar o estilo de vida de renúncia, mas sim, Karma Yoga.

Os sábios sabem que os dois caminhos, a vida de renúncia e a vida de karma yoga são igualmente importantes, não tem um melhor que outro, e ambos levam ao mesmo resultado - o autoconhecimento. Por isso, Kṛṣṇa diz a Arjuna: "escolha Karma Yoga". E Arjuna questiona "se ambos são iguais porque escolher Karma Yoga e não sannyāsa?"

A renúncia sem Yoga é muito difícil de ser conquistada porque se dispensam os meios para conquistar a mente. Karma Yoga é mais seguro.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 5 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h0m11s; cânticos iniciais.

Agora no capítulo IV, Kṛṣṇa fala sobre a importância do conhecimento, a ação e renúncia da ação.

Os Vedas declaram a natureza do sujeito como livre de limitação, morte, completo e livre em si mesmo. Isso é o que desejamos e o que os Vedas, e a Gītā, revelam como a sua própria natureza; apesar de a princípio a gente não entender todos as implicações e significadas. Tudo o que desejo ser, esse conhecimento diz que eu já sou. Isso é incrível!

Para alcançar esse conhecimento é necessário um meio de conhecimento, não é a prática de uma disciplina, como āsana, japa, meditação que me irá fazer alcançar esse ser pleno que eu sou. É necessário um meio de conhecimento pois a sensação que tenho de mim mesmo é que sou limitado, incompleto, infeliz. Eu tenho um desejo pelo completo porque, de alguma maneira, eu tenho a experiência da completude, mas não tenho a forma de o conseguir. Eu desejo aquilo que irá consumir todos os meus desejos. Eu não sei o que é esse "eu" porque existe uma confusão em relação a mim mesmo - existe uma ignorância em relação à minha natureza. A minha verdade é a verdade desse todo aquilo que eu sou é, essencialmente a verdade da causa do universo, desta criação. Para chegar neste conhecimento existe uma tradição de ensinamento, de mestre a discípulo, que se torna mestre e ensina a um outro discípulo e assim sucessivamente desde o começo do universo, o ensinamento vem do primeiro mestre - Dakṣiṇāmūrti, ou seja, īśvara, até Arjuna (por intermédio de Kṛṣṇa) e até nós.

O conhecimento, diferente da ação que produz uma coisa nova, revela alguma que já está disponível que eu não conheço plenamente - a minha natureza: aham brahmāsmi.

A professora conta a história dos 10 meninos para ilustrar o processo de autoconhecimento. Esse meio é o pramaṇa que revela o que já sou e que preciso de reconhecer.

Esta tradição revela advaita - "eu", indivíduo sou igual ao "Todo". Essa é uma coisa incrível! temos os vários textos e a própria arte que transmite esse mesmo conhecimento. Por exemplo na dança o treino dura 12 anos e é feito em duas vertentes bhāva e rasa. Bhāva aponta para a experiência e rasa para a emoção. Como o bailarino, o estudante de Vedānta tem que aprender onde nasce a emoção, como se manifesta, etc. Veja-se o exemplo da raiva: ela não nasce de uma conversa alegre e num momento surge, do nada. Tem um surgir, uma manifestação, uma expressão. Essa é a experiência da emoção - bhāva. A seguir, o dançarino tem que manifestar essa emoção e fazer a outra pessoa sentir também, isso é rasa. Conduzindo à essência básica da história, que é śānta, a paz - a natureza da pessoa.

No verso 34 do capítulo IV, fala-se sobre a aquisição do conhecimento - a confiança no conhecimento e no professor, a colocação de questões para dissipar dúvidas e através do serviço (seva). Arjuna mostra-se disponível para fazer o que for necessário para adquirir esse conhecimento.

Kṛṣṇa diz que não existe nada tão grandioso como o conhecimento; nenhum meio tão purificador como o conhecimento, pois o conhecimento liberta instantaneamente do sentimento de limitação, de impureza. Kṛṣṇa diz śraddhāvān labhate jñānam - com confiança no ensinamento e no professor essa pessoa adquire o conhecimento, é apenas uma questão de tempo.

No capítulo XV também se fala sobre a grandeza do conhecimento.

Kṛṣṇa refere que até alguns sábios estão iludidos em relação a karma: muitos pensam que a escolha é entre a ação (karma) e a não-ação (akarma), entre fazer e ficar parado. Também é necessário saber o que é ação errada - tudo isto é difícil de entender.

Finalmente, Kṛṣṇa fala sobre o estado de não-ação: não-ação só existe para o ātmā, que não tem para onde ir, já é completo, não se transforma, não tem um segundo para se relacionar mas é a consciência básica a todo o universo, é presença, não age, nada faz, por definição; é a paz, livre de limitação, está em todo o lugar, não nasce nem morre. Esse é o estado de livre de ação (akarma) - quando se descobre "eu sou ātmā" eu, instantaneamente, estou livre da ação.

No verso 18, Kṛṣṇa diz, entre todas as pessoas que existem uma pode ser chamada de sábio, aquele que está livre de ação, que na ação (no corpo, na mente) vê a não-ação (o sujeito, a presença) e numa pessoa parada vê a ação (do corpo da mente). Renúncia é a renuncia à ignorância, em qualquer lugar que esteja - esse é o conhecimento que liberta. A pessoa que alcançou a não ação alcançou o conhecimento de si mesmo, livre de limitação.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 4 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h09m16s; cânticos iniciais.

A confusão de Arjuna quanto a Dharma e Adharma e a sua vontade de largar todas as ações para se dedicar a descobrir o ser completo, a sua natureza.

Kṛṣṇa ensina-o que o problema básico é a ignorância da sua natureza fundamental que causa tumulto na mente e gera rāga/dveṣas.

Rāgas (gostos) e dveṣas (aversões) desenvolvem-se com o tempo e são sobre a nossa família, sociedade, época, a exposição religiosas, etc. Alguns são comuns a gerações, a uma nação. Quando as rāgas acontecem como eu quero eu fico feliz e quando são diferentes eu sofro.

Reagimos com irritação, raiva, quando uma situação não acontece como desejamos. Ou o contrário, com euforia. Não agimos com um estado consciente mas com um padrão que está dentro de nós. Na reação não ensine aprendizado, entendimento, apenas uma vivência. Esse acontecimento terá que se repetir para haver aprendizado. Em vários momentos, durante o aprendizado ou numa meditação, o conhecimento pode estar bem claro mas, durante a reação, os padrões velhos vêm ao de cima e isso é o problema.

Rāga e dveṣas roubam a minha paz. Ouve-se que é necessário eliminar rāgas e dveṣas ou eliminar os desejos, no entanto, é impossível acabar com os desejos. O poder de desejar é especial ao ser humano. Aniquilar o desejo é uma impossibilidade. Os gostos e aversões são aquilo que fazem o que uma pessoa é, a sua história, a sua peculiaridade.

Por isso, o que fazer quanto a rāgas e dveṣas? Neutralizar o efeito dos gostos e aversões, ao invés de os tentar eliminar.

Apesar deste ensinamento inicial de Kṛṣṇa, Arjuna insiste em renunciar às ações até ao capítulo XVIII (final do texto). A renúncia é ir além da ação. Para adquirir śreyas existem dois estilos de vida: somente o estudo (para os renunciantes) e Karma Yoga (para os yogis). Kṛṣṇa aconselha a Arjuna a vida do Karma Yoga, no entanto, Arjuna queria renunciar e abandonar a ação. No verso 5 do capítulo II, Kṛṣṇa diz a Arjuna que não é possível uma pessoa ficar, um segundo que seja, sem fazer a ação - pois essa é a sua natureza. Não fazer ações não é possível, a renúncia não é largar tudo.

A ação é melhor porque dá a oportunidade de se preparar a mente, e, a mente calma (que não reage) é o melhor que se pode querer - uma mente objetiva, que tem uma organização. Uma mente assim, que tem a capacidade de não reagir, adquire-se através de Karma Yoga. Karma Yoga tem dois momentos: o momento em que se faz a ação e o momento do recebimento dos frutos da ação (quando o resultado chega).

No momento do recebimento dos frutos deve existir prasāda buddhi - a atitude de prasāda. Prasāda é o conceito de que aquilo que ofereço num altar, num templo, etc, recebe-se de volta de forma abençoada. O resultado da ação não depende de mim, ele depende de várias leis que governam o universo. Quando vejo que ele não depende de mim, é um presente que vem para mim, de uma ordem maior - não de uma pessoa - vem de uma ordem cósmica, do próprio Absoluto. O que vem está de acordo com a minha ação e então eu recebo. A minha capacidade está apenas na ação. O resultado é adequado à ação; estar disposto a receber é prasāda buddhi. Seja minha rāga ou dveṣa, eu recebo pois vem de uma ordem maior, īśvara. Essa atitude protege da reação pois eu disponho-me a receber

Outra atitude é na ação: ao fazer a ação livre de desejo, tendo já realizado vários desejos ao longo da vida, eu desejo apenas uma mente calma, tranquila para que o conhecimento se instale. O desejo pelo autoconhecimento e pela liberação vai ganhando mais força. Kṛṣṇa diz: "o seu melhor amigo, ou o seu pior inimigo, é a sua mente". Quanto mais desejo antaḥ karaṇa śuddhi e o autoconhecimento mais os outros desejos enfraquecem, a não reação e uma mente objetiva tornam-se mais importantes.

A minha escolha é: rāga /dveṣas ou dharma?

A professora Glória conta a história dos diálogo entre Yudhiṣṭhira (Dharmaputra) e Bhīṣma, e, entre Dharmaputra e Droṇa. Depois conta a história do pai de Dhṛtarāṣtra.

Muitas vezes, ao longo da vida, esse conflito entre dharma e adharma surge. Karma Yoga na ação é īśvara arpaṇa buddhi, eu faço porque isso é a minha parte, contribuo com o meu papel deixando o adharma de lado e vou pelo dharma - quando a mente é governada por gostos e aversões eu escolho sempre de acordo com os meus padrões.

Com a mente tranquila eu vejo a reação a chegar mas eu escolha dharma - essa capacidade aquieta a minha mente. Ficar parado, num aśram, não se consegue isso, ver a bagagem de gostos e aversões e dominar a mente, ter tranquilidade frente às adversidades da vida. Em conclusão, faça a ação e não tenha apego à não-ação.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 3 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m06m; cânticos iniciais.

A posição de Arjuna de discípulo perante Kṛṣṇa.

O ensinamento de Kṛṣṇa, e da Gītā, começa no verso 11 do capítulo II e começa com um palavra que é uma negação "aśocyān". É muito relevante que comece o ensinamento com "aśocyān". Kṛṣṇa diz: o seu sofrimento é verdadeiro, você está triste, mas a causa do seu sofrimento é falsa - ele é ilegítimo, o problema é ilegítimo. O que Kṛṣṇa diz é que você está a sofrer porque se vê como um infeliz e mortal, devido a essa sensação. O ser verdadeiro e fundamental que você é é eterno e livre de limitação e o seu sofrimento é devido a uma confusão em relação ao eu, a uma ignorância quanto ao eu fundamental.

O problema não é devido à guerra, o problema fundamental é além do tempo e do espaço. Arjuna diz "se ganhar a guerra vou estar infeliz porque matei essas pessoas, e, se perder a guerra, perdi". Arjuna quer a solução do problema do ser humano que se sente carente, limitado, incompleto - o que me vai fazer estar bem comigo mesmo independentemente dessas situações. Ele não sabe o que falta, nem o que resolve o problema. O problema fundamental é um, os problemas relativos são milhares, todos os dias eles surgem. O problema fundamental a gente carrega a vida inteira e passa para a outra e para a outra. O problema fundamental é o assunto de Vedānta, resolver essa pessoa fundamental que eu sou.

"O sábio não chora coisas que são inevitáveis" - o envelhecimento do corpo, o desejo, a fome, a chegada da noite, a chegada do dia... não adianta reclamar sobre isso - é inevitável. O corpo e a mente são mutáveis, o sofrimento quanto ao absoluto não deve existir porque você é esse dehi que está sentado no corpo e esse dehi é livre de limitação; o corpo e a mente têm um início e um fim, mas o eu - sentado nesse corpo - é imutável, eterno. É aquele que existe sempre - a consciência que ilumina esse corpo mas é independente dele. Então porquê o medo da morte se o sujeito é livre da morte?

A causa do sofrimento é devido à identificação com uma natureza que não sou eu. O eu é indestrutível - não está sujeito à destruição pelos elementos. A consciência resiste à partida do corpo e das transformações, até mesmo aos diversos estados (vigília, sonho e sono profundo).

Porquê chorar? Porquê sofrer por aquilo que não morrer? Eu não mato e nem posso matar, pois a consciência é uma presença - não um objeto - e, sendo a natureza do sujeito, ela não age. Como não é um objeto não está disponível para os sentidos, não faz uma ação construir/destruir, não fala, é uma presença que tudo ilumina.

Assim como uma pessoa que usa roupas e as descarta quando estão velhas esse dehi como que usa os corpos e, quando eles vivem tudo o que era para viver, esse sujeito adquire um novo corpo e o antigo termina, é dispensado.

O sujeito é o que de mais íntimo o indivíduo tem, pois todos os objetos estão mais distantes que o sujeito, no entanto, esse eu não é conhecido. Isso é incrível! As pessoas podem conduzir uma vida inteira, adquirir vários conhecimentos, mas não terem o conhecimento de si mesmo. Isso é incrível! Para adquirir esse conhecimento é necessário desejá-lo. Isso é incrível! Ao escutar sobre um sujeito, sem características, sem qualidades, sem forma nem outros aspetos que os sentidos percebam - o corpo não é o invólucro dessa consciência, ela é a base que sustenta o universo, que está no corpo de todas as pessoas, que ilumina o tempo e o espaço, não está neste lugar nem noutro lugar - assim, é possível conduzir a pessoa a ter um deslumbre, a entender, mas não tem forma concretamente de definir esse sujeito. Alguns, ao escutar não entendem nada e outras, não conseguindo repetir o que entenderam, saem satisfeitas. Isso é incrível!

Kṛṣṇa, a seguir, fala sobre dois temas: sat que é cit e todo um estilo de vida que inclui uma reflexão sobre a vida e os valores que ajuda a entender sobre si mesmo (karma).

Arjuna faz uma pergunta sobre o conhecimento. Ele pergunta que diferença faz ter esse conhecimento que liberta da busca e quem é o sábio, ou seja, o que é a sabedoria? Relativamente, não tem como acabar com todos os problemas. O mumukṣu é aquele que busca um autoconhecimento que o liberte de estar sempre a tentar estar melhor do que está agora e a tentar resolver sempre todos os problemas. Que eu me possa libertar dessa carência constante e descobrir uma satisfação em mim mesmo - isso é resolver o problema fundamental. Quem o atinge é o sábio, que se liberta da morte, da ignorância - a ignorância é um objeto do intelecto, a consciência ilumina essa ignorância - e da carência.

A questão de Arjuna "Quem é o sábio?" decorre da descoberta que sou ilimitado, imortal, mas continuo com uma sensação de carência, de faltar qualquer coisa. Kṛṣṇa completa a visão do ātmā na resposta a essa pergunta, falando sobre plenitude (ānanda). Sábio é aquele que tem o conhecimento de si mesmo - aquele que descobre um coração pleno em si mesmo, como um oceano cheio, em que as águas entram e saem e continua completo.

O desejo é um sinal que denuncia que existe uma carência. O desejo de fazer, realizar não traz carência - esse desejo ninguém se pode libertar pois é uma necessidade básica do universo. Outro desejo é o de preenchimento através de um objeto, duma pessoa, duma situação, tornar-me mais e melhor, e denuncia um vazio. O sábio é aquele que descobre uma capacidade de estar confortável consigo mesmo, daí que os desejos sobre objetos podem vir e ir embora, mas, em basicamente descobre um coração que está pleno, está satisfeito consigo mesmo. A pessoa que, em qualquer situação, consegue lidar bem com as três características básicas da mente: bhaya, krodha e rāga (medo, raiva e desejo) que ocorrem na mente como uma resposta natural às varias situações e sem se identificar com elas, essa pessoa está livre das emoções e está satisfeita e firme na compreensão, na visão de si mesmo. Essa pessoa não entra em euforia nem em depressão. Como uma tartaruga, ela recolhe-se em si mesma, quando necessário, e depois retorna e envolve-se com os objetos se a situação o exige. A identificação com os objetos fica como um sabor que perdura até existir uma compreensão total de si mesmo. A mente agitada pode roubar o conhecimento, a paz e serenidade até que esse conhecimento esteja completamente estabelecido e claro.

O final do capítulo II serve para explicar o coração dessa pessoa que tem o conhecimento estabelecido.

A meditação sobre o objeto, o desejo sobre o objeto, o apego sobre o objeto aumenta e o desejo nasce. Do desejo não realizado nasce a raiva, perde-se a educação, memória, o intelecto, a discriminação. A pessoa vê-se destruída; o processo de reação e sofrimento não acontece de repente, mas, a partir de uma semente na mente que vai sendo alimentada. Ao entender a mente desenvolve-se um comando sobre ela e a capacidade de estar melhor com ela e sem a projeção sobre o objeto da capacidade de satisfação. O conhecimento do ser fundamental torna-se cada vez mais claro e firme. Aquele que tem esse conhecimento pode entrar e sair das situações no mundo sem problema nenhum - esse alcançou o estado de ser Brahman, absoluto.

Desta forma termina este capítulo.

"O que me leva a ajudar a a adquirir este conhecimento?" - essa é a matéria do próximo capítulo, III.