sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 5 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h0m11s; cânticos iniciais.

Agora no capítulo IV, Kṛṣṇa fala sobre a importância do conhecimento, a ação e renúncia da ação.

Os Vedas declaram a natureza do sujeito como livre de limitação, morte, completo e livre em si mesmo. Isso é o que desejamos e o que os Vedas, e a Gītā, revelam como a sua própria natureza; apesar de a princípio a gente não entender todos as implicações e significadas. Tudo o que desejo ser, esse conhecimento diz que eu já sou. Isso é incrível!

Para alcançar esse conhecimento é necessário um meio de conhecimento, não é a prática de uma disciplina, como āsana, japa, meditação que me irá fazer alcançar esse ser pleno que eu sou. É necessário um meio de conhecimento pois a sensação que tenho de mim mesmo é que sou limitado, incompleto, infeliz. Eu tenho um desejo pelo completo porque, de alguma maneira, eu tenho a experiência da completude, mas não tenho a forma de o conseguir. Eu desejo aquilo que irá consumir todos os meus desejos. Eu não sei o que é esse "eu" porque existe uma confusão em relação a mim mesmo - existe uma ignorância em relação à minha natureza. A minha verdade é a verdade desse todo aquilo que eu sou é, essencialmente a verdade da causa do universo, desta criação. Para chegar neste conhecimento existe uma tradição de ensinamento, de mestre a discípulo, que se torna mestre e ensina a um outro discípulo e assim sucessivamente desde o começo do universo, o ensinamento vem do primeiro mestre - Dakṣiṇāmūrti, ou seja, īśvara, até Arjuna (por intermédio de Kṛṣṇa) e até nós.

O conhecimento, diferente da ação que produz uma coisa nova, revela alguma que já está disponível que eu não conheço plenamente - a minha natureza: aham brahmāsmi.

A professora conta a história dos 10 meninos para ilustrar o processo de autoconhecimento. Esse meio é o pramaṇa que revela o que já sou e que preciso de reconhecer.

Esta tradição revela advaita - "eu", indivíduo sou igual ao "Todo". Essa é uma coisa incrível! temos os vários textos e a própria arte que transmite esse mesmo conhecimento. Por exemplo na dança o treino dura 12 anos e é feito em duas vertentes bhāva e rasa. Bhāva aponta para a experiência e rasa para a emoção. Como o bailarino, o estudante de Vedānta tem que aprender onde nasce a emoção, como se manifesta, etc. Veja-se o exemplo da raiva: ela não nasce de uma conversa alegre e num momento surge, do nada. Tem um surgir, uma manifestação, uma expressão. Essa é a experiência da emoção - bhāva. A seguir, o dançarino tem que manifestar essa emoção e fazer a outra pessoa sentir também, isso é rasa. Conduzindo à essência básica da história, que é śānta, a paz - a natureza da pessoa.

No verso 34 do capítulo IV, fala-se sobre a aquisição do conhecimento - a confiança no conhecimento e no professor, a colocação de questões para dissipar dúvidas e através do serviço (seva). Arjuna mostra-se disponível para fazer o que for necessário para adquirir esse conhecimento.

Kṛṣṇa diz que não existe nada tão grandioso como o conhecimento; nenhum meio tão purificador como o conhecimento, pois o conhecimento liberta instantaneamente do sentimento de limitação, de impureza. Kṛṣṇa diz śraddhāvān labhate jñānam - com confiança no ensinamento e no professor essa pessoa adquire o conhecimento, é apenas uma questão de tempo.

No capítulo XV também se fala sobre a grandeza do conhecimento.

Kṛṣṇa refere que até alguns sábios estão iludidos em relação a karma: muitos pensam que a escolha é entre a ação (karma) e a não-ação (akarma), entre fazer e ficar parado. Também é necessário saber o que é ação errada - tudo isto é difícil de entender.

Finalmente, Kṛṣṇa fala sobre o estado de não-ação: não-ação só existe para o ātmā, que não tem para onde ir, já é completo, não se transforma, não tem um segundo para se relacionar mas é a consciência básica a todo o universo, é presença, não age, nada faz, por definição; é a paz, livre de limitação, está em todo o lugar, não nasce nem morre. Esse é o estado de livre de ação (akarma) - quando se descobre "eu sou ātmā" eu, instantaneamente, estou livre da ação.

No verso 18, Kṛṣṇa diz, entre todas as pessoas que existem uma pode ser chamada de sábio, aquele que está livre de ação, que na ação (no corpo, na mente) vê a não-ação (o sujeito, a presença) e numa pessoa parada vê a ação (do corpo da mente). Renúncia é a renuncia à ignorância, em qualquer lugar que esteja - esse é o conhecimento que liberta. A pessoa que alcançou a não ação alcançou o conhecimento de si mesmo, livre de limitação.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 4 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h09m16s; cânticos iniciais.

A confusão de Arjuna quanto a Dharma e Adharma e a sua vontade de largar todas as ações para se dedicar a descobrir o ser completo, a sua natureza.

Kṛṣṇa ensina-o que o problema básico é a ignorância da sua natureza fundamental que causa tumulto na mente e gera rāga/dveṣas.

Rāgas (gostos) e dveṣas (aversões) desenvolvem-se com o tempo e são sobre a nossa família, sociedade, época, a exposição religiosas, etc. Alguns são comuns a gerações, a uma nação. Quando as rāgas acontecem como eu quero eu fico feliz e quando são diferentes eu sofro.

Reagimos com irritação, raiva, quando uma situação não acontece como desejamos. Ou o contrário, com euforia. Não agimos com um estado consciente mas com um padrão que está dentro de nós. Na reação não ensine aprendizado, entendimento, apenas uma vivência. Esse acontecimento terá que se repetir para haver aprendizado. Em vários momentos, durante o aprendizado ou numa meditação, o conhecimento pode estar bem claro mas, durante a reação, os padrões velhos vêm ao de cima e isso é o problema.

Rāga e dveṣas roubam a minha paz. Ouve-se que é necessário eliminar rāgas e dveṣas ou eliminar os desejos, no entanto, é impossível acabar com os desejos. O poder de desejar é especial ao ser humano. Aniquilar o desejo é uma impossibilidade. Os gostos e aversões são aquilo que fazem o que uma pessoa é, a sua história, a sua peculiaridade.

Por isso, o que fazer quanto a rāgas e dveṣas? Neutralizar o efeito dos gostos e aversões, ao invés de os tentar eliminar.

Apesar deste ensinamento inicial de Kṛṣṇa, Arjuna insiste em renunciar às ações até ao capítulo XVIII (final do texto). A renúncia é ir além da ação. Para adquirir śreyas existem dois estilos de vida: somente o estudo (para os renunciantes) e Karma Yoga (para os yogis). Kṛṣṇa aconselha a Arjuna a vida do Karma Yoga, no entanto, Arjuna queria renunciar e abandonar a ação. No verso 5 do capítulo II, Kṛṣṇa diz a Arjuna que não é possível uma pessoa ficar, um segundo que seja, sem fazer a ação - pois essa é a sua natureza. Não fazer ações não é possível, a renúncia não é largar tudo.

A ação é melhor porque dá a oportunidade de se preparar a mente, e, a mente calma (que não reage) é o melhor que se pode querer - uma mente objetiva, que tem uma organização. Uma mente assim, que tem a capacidade de não reagir, adquire-se através de Karma Yoga. Karma Yoga tem dois momentos: o momento em que se faz a ação e o momento do recebimento dos frutos da ação (quando o resultado chega).

No momento do recebimento dos frutos deve existir prasāda buddhi - a atitude de prasāda. Prasāda é o conceito de que aquilo que ofereço num altar, num templo, etc, recebe-se de volta de forma abençoada. O resultado da ação não depende de mim, ele depende de várias leis que governam o universo. Quando vejo que ele não depende de mim, é um presente que vem para mim, de uma ordem maior - não de uma pessoa - vem de uma ordem cósmica, do próprio Absoluto. O que vem está de acordo com a minha ação e então eu recebo. A minha capacidade está apenas na ação. O resultado é adequado à ação; estar disposto a receber é prasāda buddhi. Seja minha rāga ou dveṣa, eu recebo pois vem de uma ordem maior, īśvara. Essa atitude protege da reação pois eu disponho-me a receber

Outra atitude é na ação: ao fazer a ação livre de desejo, tendo já realizado vários desejos ao longo da vida, eu desejo apenas uma mente calma, tranquila para que o conhecimento se instale. O desejo pelo autoconhecimento e pela liberação vai ganhando mais força. Kṛṣṇa diz: "o seu melhor amigo, ou o seu pior inimigo, é a sua mente". Quanto mais desejo antaḥ karaṇa śuddhi e o autoconhecimento mais os outros desejos enfraquecem, a não reação e uma mente objetiva tornam-se mais importantes.

A minha escolha é: rāga /dveṣas ou dharma?

A professora Glória conta a história dos diálogo entre Yudhiṣṭhira (Dharmaputra) e Bhīṣma, e, entre Dharmaputra e Droṇa. Depois conta a história do pai de Dhṛtarāṣtra.

Muitas vezes, ao longo da vida, esse conflito entre dharma e adharma surge. Karma Yoga na ação é īśvara arpaṇa buddhi, eu faço porque isso é a minha parte, contribuo com o meu papel deixando o adharma de lado e vou pelo dharma - quando a mente é governada por gostos e aversões eu escolho sempre de acordo com os meus padrões.

Com a mente tranquila eu vejo a reação a chegar mas eu escolha dharma - essa capacidade aquieta a minha mente. Ficar parado, num aśram, não se consegue isso, ver a bagagem de gostos e aversões e dominar a mente, ter tranquilidade frente às adversidades da vida. Em conclusão, faça a ação e não tenha apego à não-ação.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 3 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m06m; cânticos iniciais.

A posição de Arjuna de discípulo perante Kṛṣṇa.

O ensinamento de Kṛṣṇa, e da Gītā, começa no verso 11 do capítulo II e começa com um palavra que é uma negação "aśocyān". É muito relevante que comece o ensinamento com "aśocyān". Kṛṣṇa diz: o seu sofrimento é verdadeiro, você está triste, mas a causa do seu sofrimento é falsa - ele é ilegítimo, o problema é ilegítimo. O que Kṛṣṇa diz é que você está a sofrer porque se vê como um infeliz e mortal, devido a essa sensação. O ser verdadeiro e fundamental que você é é eterno e livre de limitação e o seu sofrimento é devido a uma confusão em relação ao eu, a uma ignorância quanto ao eu fundamental.

O problema não é devido à guerra, o problema fundamental é além do tempo e do espaço. Arjuna diz "se ganhar a guerra vou estar infeliz porque matei essas pessoas, e, se perder a guerra, perdi". Arjuna quer a solução do problema do ser humano que se sente carente, limitado, incompleto - o que me vai fazer estar bem comigo mesmo independentemente dessas situações. Ele não sabe o que falta, nem o que resolve o problema. O problema fundamental é um, os problemas relativos são milhares, todos os dias eles surgem. O problema fundamental a gente carrega a vida inteira e passa para a outra e para a outra. O problema fundamental é o assunto de Vedānta, resolver essa pessoa fundamental que eu sou.

"O sábio não chora coisas que são inevitáveis" - o envelhecimento do corpo, o desejo, a fome, a chegada da noite, a chegada do dia... não adianta reclamar sobre isso - é inevitável. O corpo e a mente são mutáveis, o sofrimento quanto ao absoluto não deve existir porque você é esse dehi que está sentado no corpo e esse dehi é livre de limitação; o corpo e a mente têm um início e um fim, mas o eu - sentado nesse corpo - é imutável, eterno. É aquele que existe sempre - a consciência que ilumina esse corpo mas é independente dele. Então porquê o medo da morte se o sujeito é livre da morte?

A causa do sofrimento é devido à identificação com uma natureza que não sou eu. O eu é indestrutível - não está sujeito à destruição pelos elementos. A consciência resiste à partida do corpo e das transformações, até mesmo aos diversos estados (vigília, sonho e sono profundo).

Porquê chorar? Porquê sofrer por aquilo que não morrer? Eu não mato e nem posso matar, pois a consciência é uma presença - não um objeto - e, sendo a natureza do sujeito, ela não age. Como não é um objeto não está disponível para os sentidos, não faz uma ação construir/destruir, não fala, é uma presença que tudo ilumina.

Assim como uma pessoa que usa roupas e as descarta quando estão velhas esse dehi como que usa os corpos e, quando eles vivem tudo o que era para viver, esse sujeito adquire um novo corpo e o antigo termina, é dispensado.

O sujeito é o que de mais íntimo o indivíduo tem, pois todos os objetos estão mais distantes que o sujeito, no entanto, esse eu não é conhecido. Isso é incrível! As pessoas podem conduzir uma vida inteira, adquirir vários conhecimentos, mas não terem o conhecimento de si mesmo. Isso é incrível! Para adquirir esse conhecimento é necessário desejá-lo. Isso é incrível! Ao escutar sobre um sujeito, sem características, sem qualidades, sem forma nem outros aspetos que os sentidos percebam - o corpo não é o invólucro dessa consciência, ela é a base que sustenta o universo, que está no corpo de todas as pessoas, que ilumina o tempo e o espaço, não está neste lugar nem noutro lugar - assim, é possível conduzir a pessoa a ter um deslumbre, a entender, mas não tem forma concretamente de definir esse sujeito. Alguns, ao escutar não entendem nada e outras, não conseguindo repetir o que entenderam, saem satisfeitas. Isso é incrível!

Kṛṣṇa, a seguir, fala sobre dois temas: sat que é cit e todo um estilo de vida que inclui uma reflexão sobre a vida e os valores que ajuda a entender sobre si mesmo (karma).

Arjuna faz uma pergunta sobre o conhecimento. Ele pergunta que diferença faz ter esse conhecimento que liberta da busca e quem é o sábio, ou seja, o que é a sabedoria? Relativamente, não tem como acabar com todos os problemas. O mumukṣu é aquele que busca um autoconhecimento que o liberte de estar sempre a tentar estar melhor do que está agora e a tentar resolver sempre todos os problemas. Que eu me possa libertar dessa carência constante e descobrir uma satisfação em mim mesmo - isso é resolver o problema fundamental. Quem o atinge é o sábio, que se liberta da morte, da ignorância - a ignorância é um objeto do intelecto, a consciência ilumina essa ignorância - e da carência.

A questão de Arjuna "Quem é o sábio?" decorre da descoberta que sou ilimitado, imortal, mas continuo com uma sensação de carência, de faltar qualquer coisa. Kṛṣṇa completa a visão do ātmā na resposta a essa pergunta, falando sobre plenitude (ānanda). Sábio é aquele que tem o conhecimento de si mesmo - aquele que descobre um coração pleno em si mesmo, como um oceano cheio, em que as águas entram e saem e continua completo.

O desejo é um sinal que denuncia que existe uma carência. O desejo de fazer, realizar não traz carência - esse desejo ninguém se pode libertar pois é uma necessidade básica do universo. Outro desejo é o de preenchimento através de um objeto, duma pessoa, duma situação, tornar-me mais e melhor, e denuncia um vazio. O sábio é aquele que descobre uma capacidade de estar confortável consigo mesmo, daí que os desejos sobre objetos podem vir e ir embora, mas, em basicamente descobre um coração que está pleno, está satisfeito consigo mesmo. A pessoa que, em qualquer situação, consegue lidar bem com as três características básicas da mente: bhaya, krodha e rāga (medo, raiva e desejo) que ocorrem na mente como uma resposta natural às varias situações e sem se identificar com elas, essa pessoa está livre das emoções e está satisfeita e firme na compreensão, na visão de si mesmo. Essa pessoa não entra em euforia nem em depressão. Como uma tartaruga, ela recolhe-se em si mesma, quando necessário, e depois retorna e envolve-se com os objetos se a situação o exige. A identificação com os objetos fica como um sabor que perdura até existir uma compreensão total de si mesmo. A mente agitada pode roubar o conhecimento, a paz e serenidade até que esse conhecimento esteja completamente estabelecido e claro.

O final do capítulo II serve para explicar o coração dessa pessoa que tem o conhecimento estabelecido.

A meditação sobre o objeto, o desejo sobre o objeto, o apego sobre o objeto aumenta e o desejo nasce. Do desejo não realizado nasce a raiva, perde-se a educação, memória, o intelecto, a discriminação. A pessoa vê-se destruída; o processo de reação e sofrimento não acontece de repente, mas, a partir de uma semente na mente que vai sendo alimentada. Ao entender a mente desenvolve-se um comando sobre ela e a capacidade de estar melhor com ela e sem a projeção sobre o objeto da capacidade de satisfação. O conhecimento do ser fundamental torna-se cada vez mais claro e firme. Aquele que tem esse conhecimento pode entrar e sair das situações no mundo sem problema nenhum - esse alcançou o estado de ser Brahman, absoluto.

Desta forma termina este capítulo.

"O que me leva a ajudar a a adquirir este conhecimento?" - essa é a matéria do próximo capítulo, III.