sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 12 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 57m45s; cânticos iniciais.

Do capítulo I ao capítulo VI o tema fulcral é o indivíduo, karma yoga, renúncia e meditação; estes seis capítulos falam sobre īśvara, a causa da criação, o todo, a sua forma (não específica) mas como todo o universo, a sua natureza e como o posso compreender; ou seja falamos de jīva e īśvara.

Jīva é um ser na natureza, īśvara é a inteligência por detrás da criação, do corpo, a ordem do universo, a causa material e inteligente.

A Gītā mostra que sempre nos parecem diferentes, na verdade, não são diferentes, apesar da experiência de dualidade que toda a gente sente. Essa afirmação da não-diferença entre indivíduo e criador é como que uma ousadia - só existe um ser! Para explicar essa ousadia temos este conhecimento. Como no sonho em que temos a experiência de dualidade entre os vários personagens e ao acordar, sabendo que os personagens da sonho era eu, vê-se a dualidade como apenas uma única realidade, neste caso, criada pela mente. Eu não posso dizer isso enquanto estou a sonhar, já que, vivo a dualidade mas, ao despertar, eu posso dizer que aquilo era falso, aparente - os pensamentos sou eu.

Em relação ao universo, os Vedas dizem a mesma coisa. Por isso, são chamados de sábios os que conhecem esta verdade. O universo não é não-existente, é aparente, parece real. Acordar para uma outra realidade é a proposta de Vedānta - o indivíduo e o Todo são idênticos, fundamentalmente. Da mesma maneira que uma onda, que se vê isolada, com nascimento manifestação e morte se vê diferente do oceano, que é o Todo. Se essa onda pudesse perceber, descobriria "eu sou água, portanto, sou não diferente de todo o oceano, somos um único, eu existo no oceano, não sou separada; a verdade essencial é a mesma, não diferente". Ou seja, o conhecimento é "Eu sou eterno, sat, cit, que existe sempre, eu sou imortal assim como esse Todo; só existe o Todo, não existe indivíduo. O Todo abarca todos nós."

Com esta visão, eu cumpro o meu papel neste esquema de coisas, pois, sei que é o que deve ser feito por mim. O que me impede de agir assim é o ego - a sensação de uma realidade independente, diferente, separado do Todo, como alguém que tem o poder de determinar, totalmente, a sua própria vida.

Neste capítulo, apelidado de devoção, Kṛṣṇa não quer falar sobre a necessidade de desenvolver devoção, mas, fala da devoção como uma consequência. Nos momentos de sensação de não-separação obtemos essa clareza e essa apreciação. Nenhum ato é devoção, devoção é o entendimento, e o ato devocional é uma expressão do entendimento. No reconhecimento da real identidade do indivíduo a mente dissolve-se no Todo.

Chama-se de karma yoga quando cada um contribui fazendo o que é necessário ser feito. Ao não contribuir com o meu dever acontece aquilo que a professora contou anteriormente numa história acerca do copo com leite pedido a cada aldeão e em que todos contribuíram com água pensando que o seu pouco de água seria diluído no leite que os restantes iriam contribuir. Acontece que todos pensaram o mesmo e apenas água foi recolhida, quando o que era necessário era leite.

Quando aprecio o Todo torno-me um devoto, livre de raiva e reação, tenho a capacidade natural de aceitar e apreciar o universo todo como ele é, porque, consigo perceber uma ordem nele. Nesta līlā, neste jogo/teatro, cada indivíduo tem o seu papel. Se eu vejo o universo como uma peça, eu posso apreciar tudo isso pela grandeza do espectáculo que é. Cada um assume vários papéis e age de determinada maneira consoante as situações. Como, por exemplo, a pessoa que é cidadão de um país, chefe de uma equipa, pai de família, vizinho, etc. Cada situação exige um papel específico da mesma pessoa sem que ela os confunda. Não posso dizer que esses papéis não sou eu, porque eles estão "pendurados" em mim, mas tenho de saber que fundamentalmente sou livre dos papéis, e não sou esses papeis. Eu estou livre dos papéis mas, ao mesmo tempo, eu dou vida aos papéis. A pessoa fundamental é ātman que é livre. Eu descubro o Todo e a atitude que nasce é a devoção, a apreciação. A devoção é aquilo que este capítulo aborda.

Entre as pessoas que fazem a ação e os que se dedicam ao conhecimento Kṛṣṇa diz: "aqueles que conduzem a sua mente em Mim, sempre ativos meditam, e ao mesmo tempo têm uma apreciação por Mim são consideradas como mahayogi". Considerando que Arjuna pergunta se a renúncia ou karma yoga é melhor Kṛṣṇa responde dizendo que karma yoga é melhor, pois, se Arjuna tivesse o conhecimento não questionaria, pois a renuncia não precisa ser feita com o retiro para um lugar isolado e sem ações. Como meditar no Absoluto é difícil, caso não haja um preparo da mente, é necessário karma yoga para se manter livre de reações e apegos para entender melhor esse conhecimento.

No verso 25 do capítulo IX, Kṛṣṇa diz: "qualquer coisa que Me ofereças, uma folha, flor, fruto, seja o que for, com devoção (amor) - com a apreciação da não diferença com o Todo - nem que seja mentalmente, Eu recebo". Este é considerado o ato de ofertar.

A professora Glória fala de karuna, compaixão, empatia no sentido de acolher o outro que surge quando Eu vejo o Todo e acolho o universo com compreensão pela pessoa, observando o dharma, defendendo o que é correto e fazendo o que for possível para ajudar.

Como karma yogi faço a ação e recebo o fruto - devoção é karma yoga.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 11 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h01m59s; cânticos iniciais.

Análise dos capítulos X e XI.

Apesar da experiência do sujeito ser de limitação, por vezes, o indivíduo tem a experiência da plenitude, totalidade. O sujeito identifica-se como mortal, perecível, mas, em vários momentos, vê-se como completo. Em Vedānta, fala-se sobre esse conhecimento, sobre a totalidade. Arjuna reclama que esse conhecimento não está claro para ele. Kṛṣṇa fala-lhe sobre karma yoga, um estilo de vida específico, que consiste em não mudar a ação mas a atitude - passar a ter prasāda buddhi, receber o que chega como uma benção e saber que o que chega é exatamente o que devo receber. Essa atitude traz tranquilidade e é fundamental para que eu possa descobrir que "eu sou a paz, a fonte de qualquer felicidade experenciada, o silêncio, ātman, a verdade de tudo o que existe". Tenho de ter a capacidade de aceitar, acomodar as pessoas como elas são, sem reação. E, ao mesmo tempo, entender, apreciar īśvara - a causa material e inteligente do universo. Kṛṣṇa procura fazer Arjuna entender isso, neste momento.

Com esta visão pergunta-se agora "o que é meu?"

O "meu" é um conceito na mente, não tem realidade nenhuma, não tem conteúdo pois a pessoa apodera-se de um objeto durante um período de tempo e passa a chama-lo de "meu". Até mesmo o corpo veio dos cinco elementos e a eles retorna. O corpo pertence à terra, água, fogo, e outros elementos, e, eu não sou autor nem dono dele, pois eu não tenho poderio sobre ele. Os pais também se consideram donos dos filhos - "meu" filho; e por conseguinte, os filhos acham-se donos dos pais - o "meu" pai, a "minha" mãe. No próprio corpo, existem outros seres, bactérias que habitam à várias gerações este lugar.

Então, a quem pertence o corpo? Ao Criador, aos cinco elementos.

Nem mesmo a emoção é minha, pertence à ordem psicológica que é īśvara. Tudo o que é conhecido e desconhecido é īśvara e pertence a īśvara. Tenho de ver esse universo como a Sua expressão. Arjuna quer ver o Todo e pergunta como o pode ver. Kṛṣṇa diz-lhe que a própria inteligência é Ele, qualquer capacidade, dom, e mesmo o medo e a ilusão. Daí que, tradicionalmente as músicas são dedicadas a īśvara e a Dança ocorre frente a um altar, pois a capacidade de dançar pertence a īśvara. Diz também que em alguns lugares, objetos ou coisas Ele poderá ser visto com mais facilidade pois está mais evidente, como um legume maior que o normal (que geralmente é ofertado no templo), a cor do oceano - nessa visão o indivíduo perde a noção dos problemas e vê a grandeza de uma beleza incrível. Por alguns segundos, essa coisa proporciona um samādhi, perde-se a noção de estar separado, eu e o mundo, a dualidade. Por esse motivo, todas as tradições têm peregrinações a lugares especiais, simbólicos que engrandecem e que proporcionam esses momentos de saída da sensação de limitação. Kṛṣṇa enumera, de seguida, lugares especiais, na Índia, que proporcionam esse efeito - a essência desse ensinamento diz que em qualquer lugar do mundo onde a beleza, a grandeza, seja maravilhosa leva a um encantamento e a uma experiência de algo a mais. Kṛṣṇa diz que, entre os seres celestes, é a Lua, o Sama Veda, canto védico, Rāma, o elefante, o rei (que protege o Dharma e governa com justiça), o vento entre os purificadores, e qualquer lugar onde se veja vibhūti, poder, ou riqueza maior.

No início do capitulo XI, Arjuna pede a Kṛṣṇa para ver a sua forma cósmica, se for merecedor.

Kṛṣṇa quer que Arjuna veja a sua forma em tudo, e perceber a presença do Todo como uma única coisa, uma única realidade. No entanto, Arjuna quer ter esse experiência e Kṛṣṇa mostra-lhe essa forma cósmica. Nesse corpo aparece todo o universo. Quando Arjuna vê todo o universo fica nervoso, pois vê o universo todo ao mesmo tempo, Bhīṣma, Duryodhana e ele mesmo na batalha, a matar, o bonito e o feio, o encantador e o apavorante. Assustado, Arjuna pede a Kṛṣṇa o favor de voltar à forma normal. Kṛṣṇa volta à forma formal e refere que os sábios podem adquirir essa visão cósmica apreciando que só existe Um, só existe īśvara e nada separado do Todo.

Bhagavad Gita, Aula 10 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h07m28s; cânticos iniciais.

Do capítulo VII ao capítulo XXII, a Gītā fala de īśvara, a causa do universo. No capítulo anterior, Kṛṣṇa fala sobre brahman e define brahman - aquilo que é akṣaram, param, imutável, eterno, a natureza essencial de tudo o que existe, a base da criação. Neste capítulo XIX, ele fala de ātman, o Eu - a natureza essencial do indivíduo - mas através de īśvara.

A consciência não está localizada num lugar, não tem um início, nem fim, é além de qualquer medida, é independente do tempo, chamada de Brahman, é ātman. Eu vejo-me como o corpo, o pensamento, emoções, vejo-me limitado, carente. A visão do Eu da Gītā e de Vedānta é diferente e Kṛṣṇa quer transmitir essa visão. Aquilo que é o Eu é o Eu em todas as pessoas, em todos os seres, apesar de corpos, mentes ou intelectos diferentes - o sujeito é um único e sempre o mesmo. Então o ātman é brahman, livre de limitação e isso é preciso ser reconhecido. Esse ātman que é brahman é a causa da criação, então ele é īśvara - a verdade da criação - a causa inteligente e a causa material da criação.

Daí que, este capítulo seja chamado de rājavidyā - o conhecimento real, o conhecimento superior. Este conhecimento deve ser dominado, pois essa é a base do nosso relacionamento com o mundo, já que, o Eu é a base inclusive para o meu relacionamento comigo mesmo. A visão de um Eu eterno não é reconhecido por mim, à partida. Este conhecimento também é chamado de secreto (rājaguhya), pois não será entendido se não houver um preparo, um desejo, uma maturidade e, assim, estar pronto para entender plenamente. O segredo é sobre esse Eu que é livre de limitação, a base de tudo, contrário àquilo que eu tinha concluído sobre mim.

Eu posso ter uma experiência incrível, como a experiência de samādhi, ter uma experiência transcendental de advaita, através de yoga, de prāṇāyāma e que nivela tudo, em que todas as barreiras entre sujeito e objeto são quebradas. Essa experiência não resolve o meu problema de dualidade, de me sentir carente e limitado e assim, a experiência não transforma nada. Kṛṣṇa quer mostrar que apenas o conhecimento revela o ser eterno que sou, que já existe, que é realidade. Eu não vou produzir o eterno, mas reconhecer o que já sou - isso é rājavidyā. O conhecimento chamado de um meio de purificação, reconhecer que Eu já sou eterno, puro.

Os objetos não têm uma realidade independente, todo o universo depende da consciência e nada existe fora dela. Todo o universo de nomes e formas é sustentado através de ātman, a consciência sem uma forma específica, mas, que assume uma forma a partir da sua base.

A professora Glória dá vários exemplos para exemplificar este conceito, como o pote que existe na argila e a argila que existe em várias formas diferentes sem ser pote - a forma (pote) depende da matéria mas a causa (argila) não depende da forma (pote), da forma, comparando com o que Kṛṣṇa diz: "todos os objectos que existem estão em Mim (consciência) mas eu não estou neles" - o Absoluto não depende do universo, mesmo sem ele, o Absoluto é.

Desta maneira, o Absoluto é real, o universo relativo é aparente, pois depende do primeiro. Como os papéis que dependem de um ator, e que os espetadores chegam a confundir com a personagem que o ator desempenha. O universo não tem realidade própria, absoluta, depende de Mim, é relativo, pois o único que é absoluto é ātman, aquilo que Eu sou - esse é o poder de īśvara, o poder (yoga) de fazer aparecer, como que por magia, denominado "māyā". Isto não é facilmente percebido pela mente, pois ela mesma também é um produto de māyā. Conhecendo Este, tudo o mais será como que conhecido.

Neste capítulo, tem um verso especial, muito bonito, o verso 22, que marca o meio da Gītā, dos seus 700 versos. Refere que o que é necessário para entender isto é ter a visão clara de rāga/dveṣa, da reação, da rejeição e ter uma mente calma, tranquila; pois īśvara é o karmaphaladatṛ - aquele que dá os frutos da ação. Trata-se necessário apreciar a Ordem e receber o que com uma nova ação sem estar preocupado com yoga (aquisição daquilo que eu não ainda não tenho: reconhecimento, etc) e kṣema (manutenção do que já foi conquistado), já que, essa mesma Ordem toma conta delas. O meu controle está apenas na ação, e, eu devo agir. O fruto vem pelas leis impessoais - o resultado da ação vem Dele - essa é a atitude de karma yoga que torna a obtenção do conhecimento mais fácil e evidente.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 9 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m24s; cânticos iniciais.

Do capítulo VII ao capítulo XII, o tema é a compreensão de īśvara. No capítulo anterior, o sétimo, falamos de īśvara como causa inteligente e causa material da criação.

O capítulo VIII é chamado de tāraka brahman ou de akṣara brahman, tem esses dois nomes. Tāraka brahman quer dizer aquele que me ajuda a atravessar, ir além - do saṃsāra (a vida de altos e baixos, de sofrimento). Akṣara brahman é aquele que é imutável, o absoluto, a verdade do universo que é o sujeito. Este conhecimento de tāraka brahman fala sobre a identidade (igualdade) entre o indivíduo e o todo.

Arjuna começa com o questionamento sobre a hora da morte: o que pensar nesse momento?

Kṛṣṇa fala sobre akṣara brahman como o imutável, sem forma. Brahman vem da raiz bṛh, raiz que significa "ser grande" (no sentido de maior de todos) na forma neutra, e na forma masculina como o criador. Brahman, junto com o poder de fazer aparecer, māyā, faz toda a criação. O indivíduo tem um corpo físico, um corpo subtil (pensamento e emoções) e um corpo causal (puṇya/pāpam) - (īśvara físico é chamado de jagat, īśvara subtil é hiraṇyagarbha) Causal é o não manifesto, semente, (avyakta). Kṛṣṇa diz a Arjuna que se pensar Nele estará livre. A questão é: como pensar Nele? No momento da morte, a força vai-se, por isso, só é possível pensar em īśvara se já houve uma disciplina, e deverá pensar-se "somos um, não somos separados" - isto é preciso estar claro e estabelecido. Se não houve uma vida de Yoga, no sentido de implementar este conhecimento, no momento da morte, outras questões irão tomar conta da mente.

A professora fala sobre o filme Malika para ilustrar o tema da reencarnação.

Os pensamentos que se tornam mais fortes manifestam-e numa próxima vida como tendências. Não tire da sua mente a verdade sobre o sujeito "aham brahman" - eu não sou corpo, eu não sou mente, eu sou o universo, a consciência. Isso quebra ciclo de renascimentos. Assim, é preciso manter a disciplina de meditação e contemplação (abhyāsa) da visão da unidade com o absoluto. Durante o dia, quando a mente está livre, é necessário ver sob a perspetiva do absoluto, mesmo observando um problema relativo; e praticar a capacidade de ver, amplamente, que eu não controlo nada e abro mão, e permitindo que īśvara faça a sua parte, pois ele já o faz verdadeiramente, mas, na minha mente eu não o vejo. Com essa visão, esgota-se a bagagem para um novo nascimento e, assim, não há um próximo nascimento. Dessa forma, esse jīvanmukta, liberado vivo, torna-se um videha mukta - sem corpo causal para originar um novo nascimento. Há uma outra opção: kramamukti aquele que deseja a libertação através do conhecimento vindo do melhor professor, ou seja, brahmājī. Assim, procura alcançar brahmaloka através de várias disciplinas de yoga. Nesse lugar, aguarda o final da criação e recebe o conhecimento diretamente do criador - assim alcança o conhecimento e liberta-se.

Outra opção, é o controle de várias disciplinas de prāṇāyāma - que comandam a mente - e da repetição, ao mesmo tempo, do omkāra em formato de japa, a repetição do mantra om. Com essa disciplina diária rigorosa, focando o olhar no centro das sobrancelhas, para que o prāṇa, no momento da morte, saia pelo topo da cabeça (sahasrāra cakra), alcança-se brahmaloka.

Esse é o objetivo último de todos - brahman. O objetivo final de todas as pessoas é Om, esse Om é brahman. Conhecendo o significando do Om, meditando no Om, alcança-se o Om - "eu sou Om". Īśvara praṇidhāna é o conhecimento de jīva como īśvara, ou, de jīva como ātman.

A seguir, Kṛṣṇa fala sobre tempo relativo e daquele que está além do próprio tempo. Durante a vida, deve-se focar esse eterno para que no momento final da morte esse pensa surja e se termine com o saṃsāra cakra.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 8 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 57m26s; cânticos iniciais.

Se existe uma libertação, uma liberdade, livre de limitação, essa tem que ser a natureza do sujeito "eu já sou completamente livre", não pode ser alcançar algo que seja eterno, pois, dessa forma não será um descobrir uma realidade já existente. A visão de limitação em termos de tempo e espaço, uma identificação com o corpo, a mente e as emoções é, em si mesma, a limitação - essa visão é contraria à visão de Vedānta, do śastra, de Kṛṣṇa.

Essa visão soa como algo verdadeiro, porque, em vários momentos da vida temos essa experiência do ilimitado.

Este foi o assunto dos seis capítulos anteriores. Entramos agora na parte de estudo sobre īśvara.

Tudo o que vejo no universo parece ter uma razão de ser, ter uma lógica. Se tenho fome existem objetos para saciar essa fome, para respirar estamos munidos com órgãos para o fazer, a própria chuva afeta e relaciona-se com todos os seres, plantas, oceano, nuvens... há uma ordem, uma inteligência, na criação. Para complementar o entendimento sobre mim mesmo, quero saber quem está por detrás dessa criação, quem é o responsável por esse universo todo?

Analisando a causa de um objeto chegamos em duas causas: a material e a inteligência por detrás (upādāna kāraṇa e nimitta kāraṇa). Por exemplo, uma mesa tem a madeira como causa material e a sabedoria de alguém como causa inteligente. Há uma razão de ser para tudo, um porquê, tudo é relevante e tem uma inteligência - como as cores específicas de cada tipo de flor ou animal.

O original dos Vedas é dizer que a causa material e inteligente do universo é a mesma. Normalmente, eu penso que um objeto tem uma causa material separada da causa inteligente, como por exemplo, ao comprar uma mesa eu apenas trago comigo a causa material. Assim, em relação ao universo eu julgo haver um criador separado, que está algures no Céu.

Os Vedas dão o exemplo da aranha, que é a causa inteligente e material da teia, para demonstrar que īśvara - o criador - não se separa da sua criação nunca, o seu corpo é a criação, assim como no sonho eu sou a causa material e inteligente do sonho que estou a sonhar.

Esse assunto não é uma causa de crença pois esse universo inteiro tem que ter uma causa, apesar de eu a desconhecer. Se não houvesse causa não existiria efeito - o universo. Que causa é essa e onde está? Esse é o estudo de Vedānta.

Esse Todo é da mesma natureza que Eu, daí que, Eu sustento esse universo. Se īśvara é a causa desse universo, onde esse universo está, está esse īśvara. Todas as formas pertencem a esse criador. Todos os elementos subtis e densos, pensamentos e emoções, e ainda, o imanifesto - parā prakṛti (natureza superior, eterna e livre de limitação, ou seja, puruṣa) e aparā prakṛti (natureza inferior, ou seja, os elementos, as formas). Os objetos e corpos e a própria vida - a consciência que dá realidade a tudo. O jīva é uma parte desse todo. Assim, para me relacionar com o Todo, numa pūjā, por exemplo, eu escolho uma forma simbólica (ex: Ganeṣa). Eu posso dizer "todo o universo existe em mim porque esse "mim" é Consciência, ou, que todo o universo é sustentado por mim, o puruṣa". Com esse entendimento posso também dizer "aham brahmāsmi" - não existe separação entre mim e o todo, ela é aparente - como a divisão entre onda e oceano (a onda nada mais é que água, a verdade do próprio oceano).

A consequência nessa visão de īśvara é a compreensão que me permite ver a ordem em tudo, no corpo, na mente, nos frutos da ação vindos de leis impessoais e infalíveis. Daí que uma semente trará um determinado fruto específico e não um outro fruto qualquer. Com esta visão, eu posso relaxar e confiar pois não existe injustiça mas somente ordem e receber o resultado que chega. Não sendo aquilo que eu desejo eu posso fazer uma nova ação para modificar. Neste modo, eu posso relacionar-me com o Todo.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 7 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 1h06m59s; cânticos iniciais.

Análise do capítulo VI. A Gītā divide-se em três partes, três conjuntos de seis capítulos. O primeiro conjunto debruça-se sobre jīva (o indivíduo) que se vê limitado e tem que descobrir a sua verdadeira natureza que é livre da ação, akarta. O primeiro conjunto analisa ainda o yoga e o meio sobre como preparar a mente dessa pessoa.

A causa do sofrimento é a ignorância da sua verdadeira natureza que leva a pessoa a identificar-se com aquilo que não é - essa é a ilusão. Ao longo do tempo torna-se um hábito olhar para mim mesmo como limitado, infeliz. Torna-se uma tendência através da repetição, uma vāsanā.

É dito também que uma mente contemplativa é necessária para uma vida de renúncia.

Agora, Kṛṣṇa fala sobre meditação: renunciar não é uma ação, um ato nem físico nem mental, e uma maturidade um estado de estar livre. A meditação ou contemplação é o mesmo, não é uma coisa que se faça. Sentado, posso fazer prāṇāyāma, prāṇa vīkṣaṇa, japa, etc mas não necessariamente estou a meditar/contemplar, porque contemplar é uma capacidade de perceber, ver, a minha natureza fundamental independentemente de qualquer pensamento.

Kṛṣṇa quer dizer que o foco não é renunciar nem meditar, mas adquirir meios para estes possam acontecer naturalmente. Da mesma maneira que amar tem de ser espontâneo e não forçado, meditar ou renunciar deve surgir sem esforço, a partir do conhecimento. Uma vida de Karma Yoga vai-nos levar a uma mente contemplativa, tanto no momento da ação como na hora de receber os frutos (sem reação).

O capítulo VI fala sobre meditação/contemplação para se entender o significado da expressão "tat tvam asi" (jñāna niṣṭhā) e tornar o que foi escutado como conhecimento - diferente de uma mera experiência. Torna-se necessário entender a veracidade das palavras "Sat", "Eu" e "Pūrṇam" como não apenas a experiência de uma felicidade ou de um evento efémero, mas, para eliminar o que está a atrapalhar o conhecimento claro, como dúvidas, enganos ou falta de clareza.

Arjuna não queria ser um Karma Yogi mas renunciante pois parece ser algo melhor, e, ele também o desejava. Kṛṣṇa diz que renunciante é aquele que faz o que deve ser feito livre do resultado da ação - um renunciante tem que ser um karma yogi e um karma yogi tem que ser um renunciante, já que, um renunciante não é aquele que abandona tudo. O renunciante tem que ter uma mente similar ao de um yogi - uma mente com equilíbrio, preparo, firmeza e sem reação (śama e dama).

Aquele que conquistou Yoga consegue renunciar a qualquer coisa que acontece na sua mente - sarva saṅkalpa sannyāsī. Para isso, é necessário perder o hábito de olhar para si mesmo para baixo "eu não sou capaz, eu não consigo, eu sou infeliz" e levantar a visão de si mesmo, caso contrário a mente é o inimigo. A mente que está conquistada é a mente amiga.

A professora Glória conta a história da pessoa pobre que, subitamente, fica rica e ilustra como ela lida com uma situação inesperada utilizando os velhos hábitos, os padrões, que vêm à tona no momento. A meditação tem por finalidade criar um momento em que eu possa ver com clareza a plenitude que já é a minha natureza, a paz que eu sou, para que na hora em que preciso de lidar com as situações, internamente, eu possa entender a reação e trazer à mente a visão de mim mesmo como pleno. O maior momento de meditação é quando as situações ocorrem e a reação, na mente, contrária ao conhecimento, surge. Daí que, é em Karma Yoga, no meio das ações, que eu posso lidar com isso.

Arjuna aceita isto, mas diz a Kṛṣṇa que a mente dele é obstinada, poderosa, mais difícil de controlar que o vento. Porém, Kṛṣṇa concordando que a mente possa ser assim, tanto a de Arjuna como a dele mesmo, argumenta que com paciência, carinho, atenção, abhyāsa e vairāgya torna-se possível controlá-la.

Antes do final do capítulo, Arjuna pergunta o que acontece se morrer antes de conquistar o conhecimento. Kṛṣṇa diz-lhe que a próxima vida será uma continuidade desta, por isso, não precisa de se preocupar e pode continuar a vida de Yoga - seja um yogi, com uma mente discriminativa, contemplativa e a vitória será sua.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 6 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m53s; cânticos iniciais.

Logo no primeiro capítulo Arjuna procurou fugir à ação, Kṛṣṇa ensina a Arjuna que a melhor ação é a de Karma Yoga. A presença de rāga/dveṣas e suas reações é que são a causa do sofrimento; a ação em si não é um problema que se resolva com a não ação. A solução, não é deixar de fazer, mas lidar com a causa da reação. Arjuna pensa que a ação é o problema e que não agindo não irá criar problemas. No entanto, a questão é aprender a lidar com a ação e a reação.

Entretanto, Kṛṣṇa fala de dois estilos de vida para mokṣa: a renúncia e Karma Yoga - os dois para a mesma coisa. O mestre quer mostrar ao discípulo que o seu caminho é o de Karma Yoga.

No capítulo anterior, Kṛṣṇa tenta mostrar a Arjuna que pode renunciar não fazendo a ação ou não se identificando como o agente da ação.

A não-ação é um estado de ser, não uma opção. A única opção é perante a ação: uma ação correcta, inadequada, ou não faz a ação, porque a sua natureza é de kartā. No capítulo IV fala-se de não-ação como a descoberta de "eu por natureza não faço nada, nunca fiz nada nem poderei fazer, porque a minha natureza é consciência, o absoluto que não tem para onde ir ou fazer, é uma presença". Este estado tem que ser descoberto.

A renúncia pode ser de três tipos:
a) a renúncia como um estágio na vida - vividiṣā sannyāsa;
b) aquele que já adquiriu o conhecimento "eu sou brahman" tenha tomado, ou não, formalmente sannyāsa - vidvat sannyāsa;
c) renúncia na hora da morte - āpat sannyāsa.

A professora Glória conta a história do sábio talhante.

Arjuna desejava a primeira forma de renúncia mas Kṛṣṇa impele-o à segunda, pois esse é o sábio. Como é possível tomar sannyāsa para adquirir conhecimento Arjuna deseja isso. Acontece que ao tomar sannyāsa ficamos privados de confrontar as nossas rāga e dveṣas. Por isso, entre os dois estilos de vida, Kṛṣṇa diz que Karma Yoga é muito melhor que karma sannyāsa (renúncia). Como isso não era o que Arjuna queria ouvir ele age como se não tivesse sido dito.

Kṛṣṇa fala que o sempre renunciante, livre de reação (raiva, aversão), do desejo e capaz de lidar com as dualidades, facilmente, liberta-se de todo o aprisionamento. Renunciante não é aquele que está num lugar isolado, sem fazer nada, mas aquele que está livre de reação com uma mente tranquila. Se não existe um estilo de vida naturalmente de renúncia para a pessoa, a melhor coisa é buscar ser um vidvat sanyāsī.

A professora conta a história de Kailāsa āśram onde se ensinava sobre sannyāsa aos sanyasis, falando dessa como a melhor opção para aqueles que já estão nesse caminho, que têm uma vida simples. Muitas vezes, o uso da roupa tradicional de um renunciante pode tornar-s um motivo de orgulho - ideia contrária à própria renúncia. Àqueles que já têm família, filhos, profissão, etc, não adianta estar a elogiar o estilo de vida de renúncia, mas sim, Karma Yoga.

Os sábios sabem que os dois caminhos, a vida de renúncia e a vida de karma yoga são igualmente importantes, não tem um melhor que outro, e ambos levam ao mesmo resultado - o autoconhecimento. Por isso, Kṛṣṇa diz a Arjuna: "escolha Karma Yoga". E Arjuna questiona "se ambos são iguais porque escolher Karma Yoga e não sannyāsa?"

A renúncia sem Yoga é muito difícil de ser conquistada porque se dispensam os meios para conquistar a mente. Karma Yoga é mais seguro.