quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Bhagavad Gita, Aula 3 resumo - Vaidika, Maia

Duração da aula 59m06m; cânticos iniciais.

A posição de Arjuna de discípulo perante Kṛṣṇa.

O ensinamento de Kṛṣṇa, e da Gītā, começa no verso 11 do capítulo II e começa com um palavra que é uma negação "aśocyān". É muito relevante que comece o ensinamento com "aśocyān". Kṛṣṇa diz: o seu sofrimento é verdadeiro, você está triste, mas a causa do seu sofrimento é falsa - ele é ilegítimo, o problema é ilegítimo. O que Kṛṣṇa diz é que você está a sofrer porque se vê como um infeliz e mortal, devido a essa sensação. O ser verdadeiro e fundamental que você é é eterno e livre de limitação e o seu sofrimento é devido a uma confusão em relação ao eu, a uma ignorância quanto ao eu fundamental.

O problema não é devido à guerra, o problema fundamental é além do tempo e do espaço. Arjuna diz "se ganhar a guerra vou estar infeliz porque matei essas pessoas, e, se perder a guerra, perdi". Arjuna quer a solução do problema do ser humano que se sente carente, limitado, incompleto - o que me vai fazer estar bem comigo mesmo independentemente dessas situações. Ele não sabe o que falta, nem o que resolve o problema. O problema fundamental é um, os problemas relativos são milhares, todos os dias eles surgem. O problema fundamental a gente carrega a vida inteira e passa para a outra e para a outra. O problema fundamental é o assunto de Vedānta, resolver essa pessoa fundamental que eu sou.

"O sábio não chora coisas que são inevitáveis" - o envelhecimento do corpo, o desejo, a fome, a chegada da noite, a chegada do dia... não adianta reclamar sobre isso - é inevitável. O corpo e a mente são mutáveis, o sofrimento quanto ao absoluto não deve existir porque você é esse dehi que está sentado no corpo e esse dehi é livre de limitação; o corpo e a mente têm um início e um fim, mas o eu - sentado nesse corpo - é imutável, eterno. É aquele que existe sempre - a consciência que ilumina esse corpo mas é independente dele. Então porquê o medo da morte se o sujeito é livre da morte?

A causa do sofrimento é devido à identificação com uma natureza que não sou eu. O eu é indestrutível - não está sujeito à destruição pelos elementos. A consciência resiste à partida do corpo e das transformações, até mesmo aos diversos estados (vigília, sonho e sono profundo).

Porquê chorar? Porquê sofrer por aquilo que não morrer? Eu não mato e nem posso matar, pois a consciência é uma presença - não um objeto - e, sendo a natureza do sujeito, ela não age. Como não é um objeto não está disponível para os sentidos, não faz uma ação construir/destruir, não fala, é uma presença que tudo ilumina.

Assim como uma pessoa que usa roupas e as descarta quando estão velhas esse dehi como que usa os corpos e, quando eles vivem tudo o que era para viver, esse sujeito adquire um novo corpo e o antigo termina, é dispensado.

O sujeito é o que de mais íntimo o indivíduo tem, pois todos os objetos estão mais distantes que o sujeito, no entanto, esse eu não é conhecido. Isso é incrível! As pessoas podem conduzir uma vida inteira, adquirir vários conhecimentos, mas não terem o conhecimento de si mesmo. Isso é incrível! Para adquirir esse conhecimento é necessário desejá-lo. Isso é incrível! Ao escutar sobre um sujeito, sem características, sem qualidades, sem forma nem outros aspetos que os sentidos percebam - o corpo não é o invólucro dessa consciência, ela é a base que sustenta o universo, que está no corpo de todas as pessoas, que ilumina o tempo e o espaço, não está neste lugar nem noutro lugar - assim, é possível conduzir a pessoa a ter um deslumbre, a entender, mas não tem forma concretamente de definir esse sujeito. Alguns, ao escutar não entendem nada e outras, não conseguindo repetir o que entenderam, saem satisfeitas. Isso é incrível!

Kṛṣṇa, a seguir, fala sobre dois temas: sat que é cit e todo um estilo de vida que inclui uma reflexão sobre a vida e os valores que ajuda a entender sobre si mesmo (karma).

Arjuna faz uma pergunta sobre o conhecimento. Ele pergunta que diferença faz ter esse conhecimento que liberta da busca e quem é o sábio, ou seja, o que é a sabedoria? Relativamente, não tem como acabar com todos os problemas. O mumukṣu é aquele que busca um autoconhecimento que o liberte de estar sempre a tentar estar melhor do que está agora e a tentar resolver sempre todos os problemas. Que eu me possa libertar dessa carência constante e descobrir uma satisfação em mim mesmo - isso é resolver o problema fundamental. Quem o atinge é o sábio, que se liberta da morte, da ignorância - a ignorância é um objeto do intelecto, a consciência ilumina essa ignorância - e da carência.

A questão de Arjuna "Quem é o sábio?" decorre da descoberta que sou ilimitado, imortal, mas continuo com uma sensação de carência, de faltar qualquer coisa. Kṛṣṇa completa a visão do ātmā na resposta a essa pergunta, falando sobre plenitude (ānanda). Sábio é aquele que tem o conhecimento de si mesmo - aquele que descobre um coração pleno em si mesmo, como um oceano cheio, em que as águas entram e saem e continua completo.

O desejo é um sinal que denuncia que existe uma carência. O desejo de fazer, realizar não traz carência - esse desejo ninguém se pode libertar pois é uma necessidade básica do universo. Outro desejo é o de preenchimento através de um objeto, duma pessoa, duma situação, tornar-me mais e melhor, e denuncia um vazio. O sábio é aquele que descobre uma capacidade de estar confortável consigo mesmo, daí que os desejos sobre objetos podem vir e ir embora, mas, em basicamente descobre um coração que está pleno, está satisfeito consigo mesmo. A pessoa que, em qualquer situação, consegue lidar bem com as três características básicas da mente: bhaya, krodha e rāga (medo, raiva e desejo) que ocorrem na mente como uma resposta natural às varias situações e sem se identificar com elas, essa pessoa está livre das emoções e está satisfeita e firme na compreensão, na visão de si mesmo. Essa pessoa não entra em euforia nem em depressão. Como uma tartaruga, ela recolhe-se em si mesma, quando necessário, e depois retorna e envolve-se com os objetos se a situação o exige. A identificação com os objetos fica como um sabor que perdura até existir uma compreensão total de si mesmo. A mente agitada pode roubar o conhecimento, a paz e serenidade até que esse conhecimento esteja completamente estabelecido e claro.

O final do capítulo II serve para explicar o coração dessa pessoa que tem o conhecimento estabelecido.

A meditação sobre o objeto, o desejo sobre o objeto, o apego sobre o objeto aumenta e o desejo nasce. Do desejo não realizado nasce a raiva, perde-se a educação, memória, o intelecto, a discriminação. A pessoa vê-se destruída; o processo de reação e sofrimento não acontece de repente, mas, a partir de uma semente na mente que vai sendo alimentada. Ao entender a mente desenvolve-se um comando sobre ela e a capacidade de estar melhor com ela e sem a projeção sobre o objeto da capacidade de satisfação. O conhecimento do ser fundamental torna-se cada vez mais claro e firme. Aquele que tem esse conhecimento pode entrar e sair das situações no mundo sem problema nenhum - esse alcançou o estado de ser Brahman, absoluto.

Desta forma termina este capítulo.

"O que me leva a ajudar a a adquirir este conhecimento?" - essa é a matéria do próximo capítulo, III.

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